MEC: Pastor que pedia suposta propina chamou políticos de “malandros”, relata prefeito

Relatos apontaram que religioso amigo do ex-ministro Milton Ribeiro pedia dinheiro e até ouro como condição para liberar verba

Foto: Reprodução / YouTube / Divulgação

Em depoimento à Comissão de Educação do Senado, nesta terça-feira, o prefeito de Bonfinópolis (GO), Kelton Pinheiro (Cidadania), afirmou aos senadores que o pastor Arilton Moura chegou a chamá-lo de “malandro” ao pedir propina para ajudar a liberar recursos da Educação para o município. O caso ocorreu em 11 de março do ano passado, segundo o prefeito, após reunião no Ministério da Educação (MEC), com a presença do ex-ministro Milton Ribeiro.

O prefeito conta ter sido convidado por Arilton e pelo pastor Gilmar Santos para o encontro no MEC. No mesmo dia, ele e os outros prefeitos no local foram chamados por Arilton para um almoço em um restaurante em Brasília.

“Estávamos almoçando, onde sentou na minha frente o pastor Gilmar. E ali eu percebi uma movimentação do pastor Arilton em outras mesas. Não conhecia as outras pessoas que estavam ali, mas pude perceber que eram prefeitos que participaram da reunião no ministério”, contou.

O prefeito ainda acrescentou no relato o que disse ter ouvido de um dos pastores. “Quando chegou o pastor Arilton na minha mesa e me abordou de uma forma muito abrupta e direta, dizendo: ‘Olha, prefeito, vi aqui que o seu ofício está pedindo uma escola de 12 salas. Essa escola deve custar uns R$ 7 milhões de recurso para ser liberado. Mas, é o seguinte, eu preciso de R$ 15 mil na minha mão hoje. Faz uma transferência para a minha conta. Esse negócio para depois não cola comigo não, porque vocês políticos são um bando de malandros, que não têm palavra. Se não pegar antes, depois não paga ninguém'”.

Na ocasião, segundo o prefeito, Arilton ainda disse que o valor cobrado era menor do que o que vinha sendo demandado de outros prefeitos. “‘R$ 15 mil para você, que está com o pastor Gilmar. Para os outros é R$ 30 mil, R$ 40 mil'”, disse pastor, conforme o relato de Pinheiro.

Primeiro contato

O prefeito de Bonfinópoolis contou que o contato com o pastor começou no início do ano passado, quando uma pessoa o abordou pedindo um contato de telefone. A reunião com Gilmar ocorreu em Goiânia, na sede da igreja presidida pelo pastor. O pastor Arilton também acompanhou o encontro. Na ocasião, Arilton disse, segundo o prefeito: “Olha, vou ser direto com você. Temos um canal bom com o ministro, temos levado prefeitos às reuniões para acelerar liberação de recursos”. Ele, então, questionou qual era a demanda de Bonfinópolis. Pinheiro falou sobre a necessidade de um novo prédio para uma escola em situação precária. O pastor o orientou a fazer um ofício para despachar com o ministro.

Sem entender a situação, o prefeito perguntou o motivo pelo qual os pastores ofereciam ajuda. Segundo Pinheiro, Arilton disse que não havia um motivo específico, mas naquele momento pediu uma “contribuição” para a igreja de Gilmar: a compra de mil bíblias a R$ 50 cada (total de R$ 50 mil). O prefeito explicou que não tinha condição de fazer a aquisição. Mesmo assim, os pastores o chamaram para uma reunião na semana seguinte, em 11 de março, no MEC.

No auditório, o ex-ministro Milton Ribeiro fazia parte da mesa de autoridades, ao lado dos dois pastores, do presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes da Ponte, e de técnicos do ministério. O prefeito detalhou que Ribeiro deu uma palestra, começando com a leitura de um trecho bíblico. Na ocasião, frisou que não havia necessidade de prefeitos procurarem intermediários, e que era possível dialogar direto com o MEC.

Foi depois desse encontro que, em um almoço, Arilton pediu a propina, segundo o prefeito. Na ocasião, Gilmar permaneceu calado, conforme Pinheiro. “Aquilo me deu ânsia de vômito. Eu fiquei sem chão, sem maneira de me comportar”, completou o gestor, que disse ter se retirado imediatamente.

“Depois de uma semana, recebi de novo ligação do pastor Arilton. ‘Prefeito, você tem interesse em concluir o negócio?’, e eu disse que não. Eu pensei que naquele momento tratava de um golpe, de um golpista querendo ludibriar prefeitos de boa vontade, para tentar tomar um dinheiro aqui, vendendo facilidades que não tem. Fica ali do lado do ministro e vai vender isso para as pessoas”, completou.

Pinheiro explicou que não denunciou imediatamente por achar que era um golpista em uma ação isolada. Sem pagar a quantia, o município nunca recebeu os recursos para a escola, e o pedido continua em análise.

Ouro como propina

Outros dois prefeitos relataram à Comissão que houve pedido de dinheiro e até de ouro por parte do pastor Arilton Moura para a liberação de recursos da Educação. Os depoimentos ocorrem após o jornal O Estado de S.Paulo ter revelado um suposto esquema de tráfico de influência envolvendo a atuação dos dois pastores no MEC. A Folha de S.Paulo também divulgou um áudio no qual o ex-ministro Milton Ribeiro relata que a pasta prioriza pedidos feitos pelo pastor Gilmar, a pedido do presidente da República, Jair Bolsonaro.

Em 25 de março, Gilmar repostou uma nota publicada em redes sociais e assinada pela Convenção Estadual de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus, Ministério Cristo Para Todos, no Maranhão (Cemaid), em apoio ao pastor e repudiando o que chamou de “campanha irresponsável, covarde e sistemática, de difamação e desmoralização da pessoa do pastor Gilmar Santos”.

A reportagem do R7 tenta contato com os pastores Arilton e Gilmar. O espaço segue aberto para manifestação.