“Estamos aqui para mostrar que as coisas não podem se repetir”, sustenta promotora do caso Kiss

Lúcia Helena Callegari relatou que o processo é o mais difícil da carreira dela

Foto: Ricardo Giusti/CP

A promotora Lúcia Helena Callegari, representante do Ministério Público, apontou, na tarde desta quinta-feira, na fase de debates do julgamento do caso da boate Kiss, que os jurados terão uma missão muito importante sobre o processo. “Os senhores estão aqui para mostrar ao mundo que as coisas não podem se repetir. Os senhores têm mais do que a missão de julgar. Nós estamos aqui para que as coisas não se repitam”, afirmou.

Segundo a promotora, esse processo é o mais difícil da carreira dela, não pelo tamanho e nem pela duração. “O tamanho a gente supera. É por começar a ler e chorar em cada página, pela dor que cada depoimento carrega. Meu coração agora é um pouco de Santa Maria”, disse. Ela ainda relembrou o depoimento do empresário e ex-produtor Alexandre Marques, que admitiu a possibilidade de uso, ainda hoje, de artefato pirotécnico em eventos e festas, embora não trabalhe mais no setor. “Centenas de pessoas morreram e se feriram em vão?”, questionou a promotora. Lúcia Helena salientou que ouvir isso durante o julgamento “doeu”.

Ao fazer uso de uma lousa, a promotora escreveu o nome de cada réu e, ao lado, a relação deles com a tragédia. “Nós temos quatro pessoas para julgar e cada uma delas tem uma história”, disse. Ela criticou o fato de o ex-vocalista da Gurizada Fandangueira, Marcelo dos Santos, ter usado o artefato pirotécnico e ter alcançado a altura suficiente para causar o início do fogo. “O que mais me choca é que nunca houve a intenção de avisar ninguém”, lamentou.

Sobre Luciano Bonilha, produtor do grupo musical, ela chamou a atenção pelo crachá dele não ter nenhum “chamuscado” após o incêndio. A promotora ainda destacou, com o uso de vídeo que mostra Marcelo largando o microfone no chão após o início do incêndio, que segundo o depoimento de funcionários do supermercado que existe em frente à boate, os músicos da Gurizada Fandangueira foram os primeiros a sair do local.

A promotora ainda apresentou materiais de divulgação da Gurizada Fandangueira e reforçou que, entre os textos, diziam que o diferencial do grupo era o uso de efeitos e pirotecnia nos shows. Lúcia também apresentou a nota de compra da espuma que pegou fogo e um vídeo com o depoimento do funcionário da loja onde o músico da banda comprou o artefato pirotécnico. “Sempre se acreditou na sorte. Quando se acredita na sorte, se assume o risco de matar”, disse.

Lúcia ainda falou sobre o depoimento de Elissandro Spohr, o primeiro réu a falar no julgamento, observando que ele não chorou pela morte das vítimas, mas pelo que aconteceu à boate Kiss, que o acusado dizia ser “sua”. Ela ainda chamou o também ex-sócio da casa noturna, Mauro Hoffmann, de insensível após citar depoimentos relatando que ele virou as costas quando viu as pessoas serem arrastadas para fora do estabelecimento na noite da tragédia.

“Estamos com a dor das 242 almas. Nós estamos aqui para fazer uma história que pode ser positiva ou negativa. Estamos aqui para dizer se nós aprovamos ou não aquela conduta. Hoje se nós absolvermos ou entendermos que não se assume o risco, nós estaremos dizendo para a sociedade ‘continuem!'”, destacou. “Façam aquilo o que os senhores deveriam fazer para os seus filhos”, encerrou.