Após a necessidade de grande atuação do governo na articulação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos Precatórios na Câmara dos Deputados, o trabalho deve ficar ainda mais difícil para o Executivo no Senado Federal. O texto está longe de ter o apoio mínimo de 3/5 da Casa (49 senadores) para ser aprovado. Levantamento feito pelo R7 mostra que, dos 81 senadores, apenas 18 confirmaram que votarão a favor da proposta que chegou da Câmara. O número não chega à metade do que o necessário para a PEC ser aprovada.
Nos últimos dias, a reportagem procurou os senadores e as assessorias dos parlamentares para questionar qual será a posição de cada um deles quando o tema for levado ao plenário da Casa. Até o momento, 28 senadores já se dizem contra a proposta; outros 10 ainda não sabem como vão votar; e 19 não quiseram responder. Ou seja, somando os parlamentares que não tomaram posição e os favoráveis à proposta, o governo tem 47 votos, ainda assim abaixo do que precisa.
Os senadores Acir Gurgacz (PDT-RO), Kátia Abreu (PP-TO) e Soraya Thronicke (PSL-MS) estavam em missão oficial e não responderam ao R7. Também não houve resposta de Chiquinho Feitosa (DEM-CE) e Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). A reportagem não levou em conta o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pois ele não costuma votar nas matérias analisadas no plenário. Entretanto, segundo o regimento interno do Senado, o presidente pode votar para desempatar votações ostensivas.
Ainda que haja imenso apelo do governo, a proposta ainda não tem resposta positiva de algumas figuras governistas, como o senador Marcos Rogério (DEM-RO), que disse à reportagem que o cenário não é fácil e informou, por meio da assessoria, que prefere não responder como vai votar; e de parlamentares do PP, como a líder do bloco que envolve a sigla, MDB e Republicanos, Mailza Gomes (AC). Ela disse não saber qual será o seu voto. A senadora integra o partido do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, articulador do governo.
A PEC tem ampla rejeição no Senado por permitir que os precatórios, dívidas da União reconhecidas pela Justiça, não sejam pagos de forma integral nos próximos anos pelo governo federal. O texto também dá aval a um drible no Teto de Gastos, norma de austeridade fiscal que limita o aumento dos gastos federais ao Orçamento do ano anterior corrigido pela inflação. O reajuste abre R$ 91,6 bilhões na folha orçamentária de 2022, valor considerado exagerado pelos senadores.
Muitos parlamentares têm desconfiança sobre como esses recursos serão utilizados. A proposta vem tramitando no Congresso sob o argumento de possibilitar que o governo pague o Auxílio Brasil, programa social substituto do Bolsa Família, a R$ 400. Mas para garantir esse valor a cada uma das famílias beneficiárias, o Executivo vai usar, no máximo, R$ 50 bilhões dos recursos liberados pela PEC.
Desta forma, por permitir uma folga no Orçamento maior do que realmente é necessário para a execução do Auxílio Brasil, a PEC é vista como um calote por grande parte dos senadores, além de uma medida eleitoral para beneficiar o presidente Jair Bolsonaro, que tentará a reeleição em 2022.
Por outro lado, apesar do cenário de desconfiança, parlamentares são pressionados a votar a matéria justamente pela justificativa do governo de financiar o Auxílio Brasil. Líder do MDB, Eduardo Braga (AM) disse à reportagem que a bancada está dividida, e que deve dialogar com o relator da matéria na CCJ, Fernando Bezerra (MDB-PE), e os outros senadores do partido na próxima semana. “Vamos carregar nas costas a fome do país? E o governo apontando para nós e dizendo ‘Nós tentamos, mas o Senado não quis resolver o problema da fome'”, pondera Braga.
Fernando Bezerra, líder do governo no Senado, admite que a proposta terá dificuldade para ser aprovada na Casa, mas tem confiança na aprovação da matéria. O desafio do governo é evitar a redução do espaço fiscal que a proposta cria. “Acho que existe uma indagação se é excessivo ou não. Não tem excesso. Meu papel vai ser procurar os líderes e convencer, mostrando as informações, para que a gente eventualmente evite a redução do espaço fiscal”, afirmou à reportagem.
Críticas
Algumas bancadas, como a do PT e do Podemos, votarão em peso contra a PEC. “A fome, a miséria e a pobreza no Brasil são problemas estruturais. Para combatê-los, é preciso que se estabeleça um projeto que não seja tão somente de políticas públicas de governo, mas políticas de Estado. Programas sociais são investimentos na vida humana e devem ir além de políticas pontuais de curto prazo, como essa PEC dos Precatórios”, pondera Paulo Paim (PT-RS).
Também contrário à PEC, Izalci Lucas (PSDB-DF) defende que o Senado altere o texto. “O Senado é a Casa revisora, a Casa moderadora. Não podemos é gerar inflação, furar o teto de gastos e ser contra a lei da regularidade fiscal. Não pode haver irresponsabilidade em cima disso”, destaca.
Alternativas
O Senado tem três propostas alternativas à PEC. Uma delas é do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Ele pontua que dificilmente o texto aprovado pelos deputados será mantido no Senado. “Precisamos de um programa permanente, não de um programa eleitoreiro que só vai valer até dezembro do ano que vem”, frisa o parlamentar. Outro texto é do senador José Aníbal (PSDB-SP), no qual busca assegurar um alívio de R$ 76 bilhões na folha orçamentária de 2022 e permitir o pagamento do programa nos moldes que o governo espera.
Uma terceira alternativa ao texto aprovado pela Câmara foi apresentada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). A proposta do sergipano prevê a exclusão do teto de gastos e o pagamento de valores resultantes de acordos terminativos de litígio ou de acordos em que o precatório sirva de moeda ao pagamento de dívidas para com a União, chamado entre economistas de “encontro de contas”. A estimativa é que a União teria uma folga de cerca de R$ 29 bilhões no Orçamento de 2022.