Um dia após a revelação de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, mantém uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso fiscal no Caribe, políticos de várias tendências e partidos se manifestaram pedindo que o caso seja investigado.
Reportagem feita por um consórcio internacional de imprensa revelou, nesse domingo, que Guedes mantém investimentos de US$ 9,5 milhões na offshore. Com a desvalorização do real durante o comando de Guedes no Ministério da Economia, o investimento, que equivalia a R$ 35 milhões em agosto de 2015, hoje chega a R$ 51 milhões.
O líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), e outros líderes de partidos que se opõem ao governo do presidente Jair Bolsonaro protocolaram uma representação no Ministério Público pedindo que Guedes seja investigado por improbidade administrativa.
O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) e líderes na Câmara também anunciaram que vão pedir a convocação do ministro para dar esclarecimentos no plenário sobre as denúncias. Em redes sociais, Kataguiri classificou como “gravíssima” a revelação da manutenção de offshore por Guedes enquanto exerce o cargo de ministro da Economia.
O deputado afirmou que também vai pedir ao Ministério Público que o ministro seja alvo de investigação. “Em havendo comprovação, é caso de impeachment e cadeia”, escreveu Kataguiri.
Sem citar offshore, Guedes fala em evento sobre Orçamento no TCU
Do outro lado do Congresso, o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal (STF). No documento, Randolfe pede que o Supremo requeira à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma investigação preliminar e instauração de inquérito.
Ex-apoiador do governo Bolsonaro, o deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) também criticou Guedes, a quem chamou de “especulador de mercado”. “E, com a fome e a miséria no Brasil, ficou mais rico ainda. Deveria ser exonerado do governo. Mas, como é o Bolsonaro, nada vai acontecer”, criticou o deputado.
“Se mantém empresa, não pode ser ministro de Estado. Se mantém empresa fora do país, aí é que não pode mesmo. Se mantém empresa fora do país em regime de tributação diferenciada (offshore), a situação fica insustentável eticamente, afinal se trata do ministro da Economia”, apontou.
O deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ), líder da Minoria na Câmara, ironizou a situação do ministro. Com a nova alta do dólar, nesta segunda, o deputado afirmou que Guedes “deve estar festejando”.
Pandora Papers
A investigação que revelou uma série de offshores ligadas a políticos, empresários e celebridades de vários países, batizada de “Pandora Papers”, teve a participação de 615 jornalistas de 149 veículos em 117 países. Entre as empresas envolvidas na apuração, o jornal The Washington Post, a rede britânica BBC, a Radio France, o jornal alemão Die Zeit e a TV japonesa NHK.
Na lista de brasileiros donos de offshores aparece também o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Guedes e Campos Neto disseram que os empreendimentos foram declarados na Receita Federal e negaram irregularidades.
A “Pandora Papers” aponta que Campos Neto respeitou as normas vigentes ao não fazer investimentos depois de assumir o cargo no Banco Central. Guedes mantém a empresa aberta mas não respondeu sobre movimentações ou sobre a natureza de uma possível operação do tipo.
A lei permite que brasileiros mantenham empresas offshore, contanto que elas sejam declaradas junto à Receita Federal e ao Banco Central. Também é exigido que os recursos tenham origem lícita. Quem exerce cargo público fica sujeito a uma série de regras específicas, justamente para evitar autofavorecimento.
Especialistas ouvidos pelo R7 dizem que a atuação de Paulo Guedes no comando do Ministério da Economia pode caracterizar conflito de interesses – a proposta de reforma tributária encaminhada por ele ao Congresso propondo isenção de impostos sobre os rendimentos de empresas no exterior o beneficia diretamente, por exemplo.
Nesta segunda, ao participar de um evento do Tribunal de Contas da União sobre o Orçamento, Guedes não se manifestou sobre o assunto. Na agenda oficial para esta segunda, o ministro tinha ainda duas reuniões previstas, com o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e com o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Caio Paes de Andrade.