Após a aprovação do novo Código Eleitoral na Câmara dos Deputados, a possibilidade de que o Senado Federal vote a matéria a tempo de começar a valer para as eleições do ano que vem é vista como pequena pelos parlamentares. As alterações devem ser aprovadas até 2 de outubro, a um ano do pleito de 2022, para que entrem em vigor. Além disso, em caso de alteração no Senado, a matéria precisa voltar à Câmara. Com pontos polêmicos, o novo código enfrenta resistências que podem atrasar a tramitação.
Em reunião de líderes nesta quinta-feira, o assunto não chegou a ser discutido, por ainda não ter começado a tramitar no Senado. Os parlamentares, entretanto, já dizem ser pouco provável que o texto seja aprovado a tempo. Líder da minoria no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN) afirmou que o novo código não deve entrar agora. “Sou muito favorável para que haja um Código Eleitoral, acho legal consolidar a legislação eleitoral em um código; acho legal ter partidos mais fortes, prezar essa questão de configuração. Mas isso ainda está meio longe”, afirmou.
O senador Marcelo Castro (MDB-PI) também ressaltou que, apesar de ser um texto que consolida uma legislação já existente, há diversos pontos polêmicos que são alvo de questionamento e que exigem debate. Um dos pontos que está gerando discussões é o relativo à quarentena eleitoral de quatro anos para juízes, membros do Ministério Público, policiais federais, rodoviários federais, policiais civis, guardas municipais, militares e policiais militares.
“O grosso do Código é uma consolidação da legislação que já existe, mas tem bastante inovação. E cada inovação, quando você junta para discutir, um quer de um jeito, outro quer de outro. A questão da quarentena passou por três votos. E, para estar vigente na próxima eleição, teria que ser votado como está, o que não é muito provável”, afirmou.
O senador Lasier Martins (Podemos-RS), líder do bloco Podemos/PSDB/PSL, ressaltou esperar que a matéria não seja colocada em votação. “Não pode ser no afogadilho”, declarou. A discussão no Senado discussão deve ficar centralizada na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma eleitoral. Ela é relatada pela senadora Simone Tebet (MDB-MS), que já apresentou relatório contrário à volta das coligações.
Ao R7, ela pontuou que ninguém quer tratar de Código Eleitoral sem antes votar, na CCJ, a PEC das coligações, quando a maioria deve barrar a volta dessa possibilidade. “Como nem começamos a avançar, estou vendo cada vez com mais dificuldade. Ainda que (o código) tenha um ou dois itens importantes, o medo do Senado é que ao fazer qualquer alteração, quando voltar para a Câmara, ela tenha a palavra final e reintroduza tudo aquilo que o Senado rejeite. Não vejo como o Código Eleitoral avançar para valer nas eleições de 2022”, afirmou.
Saiba mais
A Câmara dos Deputados aprovou, na noite dessa quarta, os destaques do novo Código Eleitoral, completando a análise do projeto, que agora segue para apreciação do Senado.
O código integra toda a legislação eleitoral atual, incluindo resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em uma única lei. O texto soma mais de 900 páginas. Para compreender as mudanças, o R7 listou alguns dos principais pontos da nova regulamentação.
– Quarentena para juízes e policiais
Juízes, membros do Ministério Público, policiais federais, rodoviários federais, policiais civis, guardas municipais, militares e policiais militares que queiram concorrer nas eleições terão de se desligar dos cargos pelo menos quatro anos antes do pleito.
– Redes sociais
Foi retirado trecho do projeto que proibia redes sociais de limitarem “conteúdo de ordem política, ideológica, artística ou religiosa de candidatos a cargos políticos”. Segundo a oposição, essa parte do projeto repete os termos da Medida Provisória 1068/21, devolvida ao governo pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Mesmo podendo até excluir conteúdo, as medidas de moderação ou limitação não devem ser adotadas visando desequilibrar a igualdade de condições entre os postulantes.
– Divulgação de pesquisas
As pesquisas eleitorais só poderão ser divulgadas até a sexta-feira anterior à eleição (antevéspera do pleito). Até então, os resultados dos levantamentos podiam ser publicados no dia da votação. Os institutos ainda deverão divulgar o percentual de acerto das últimas cinco eleições.
– Sobras de vagas
Podem concorrer apenas os candidatos que tiverem obtido votos mínimos equivalentes a 20% do quociente eleitoral e os partidos que obtiverem um mínimo de 80% desse quociente. As sobras são vagas para cargos proporcionais (deputados e vereadores). O quociente eleitoral é o número a partir da divisão dos votos válidos pelo número de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral (câmaras municipais, assembleias legislativas e Câmara dos Deputados).
– Crimes eleitorais
Texto acrescenta delitos como a divulgação de notícias falsas (fake news) e a violência política contra as mulheres. Boca de urna, transporte de eleitores, propaganda e comícios ou carreatas no dia das eleições deixarão de ser considerados crime eleitoral.
– Dados falsos
Publicar ou compartilhar fatos inverídicos ou “gravemente” descontextualizados, de modo consciente, para influenciar o eleitorado pode resultar em pena de 1 a 4 anos de reclusão e multa. O mesmo vale para quem produz, oferece ou vende vídeo de conteúdo inverídico sobre partidos ou candidatos. Produzir banco de dados para divulgar informação fora dos limites permitidos resulta em reclusão de 2 a 4 anos. No caso de fake news, a pena aumenta da metade a 2/3.
– Violência política contra mulheres
A violência política contra mulheres é caracterizada por impedir, dificultar ou restringir os direitos políticos da mulher, constranger, humilhar, perseguir, assediar ou fazer qualquer distinção contra a mulher. O crime pode levar à reclusão de 1 a 4 anos, e a pena é aumentada em 1/3 se for contra gestante, maior de 60 anos ou pessoa com deficiência.
– Caixa 2
Recursos não contabilizados usados nas campanhas eleitorais próprias ou de terceiros são criminalizados pelo novo código. Quem pratica esse delito, doando, recebendo ou utilizando os recursos, está sujeito a pena de 2 a 5 anos de reclusão. Pelo texto, o juiz deixar de aplicar a pena ou pode reduzi-la de 1/3 a 2/3 se a irregularidade não informada na prestação de contas for referente a valores de origem lícita e respeitando regras como os limites legais de doação ou de gastos para o cargo.
– Improbidade
Prazo de inelegibilidade continua sendo de oito anos, mas passa a ser contado a partir da sentença de condenação e não após o cumprimento da pena. É considerado inelegível por oito anos também o político que renunciar durante o processo de cassação.
– Debates eleitorais
Candidatos de partidos com um mínimo de cinco deputados federais terão direito a participar de debates políticos.
– Candidaturas coletivas
O código autoriza a prática de candidaturas coletivas para os cargos de deputado e vereador. O partido deve autorizar e regulamentar essa candidatura em estatuto ou por resolução do diretório nacional. A candidatura coletiva deve ser representada formalmente por apenas um filiado do partido, mas o nome coletivo pode ser registrado na Justiça Eleitoral juntamente com o nome do candidato. O mesmo vale para propagandas, caso não haja dúvidas sobre a identidade do candidato registrado.
– Prestação de contas
Os partidos agora podem prestar contas dos volumes arrecadado e gasto nas campanhas pelo sistema da Receita Federal. Até então, isso era feito exclusivamente pelo modelo da Justiça eleitoral.
– Prisão no período eleitoral
O novo código prevê restrição de prisão nos três dias que antecedem a eleição (hoje são cinco dias), exceto quando flagrante ou sentença criminal condenatória por crime inafiançável. A restrição após a eleição passa a ser de 24 horas (hoje é de 48). Para candidatos, o período em que não poderão ser presos é reduzido de 15 para 10 dias antes da eleição até o fim da votação, exceto no caso de flagrante.
– Fundo Partidário
Código mantém os tipos de gastos e acrescenta despesas com transporte aéreo, aluguel de veículos, consultoria sobre proteção de dados e outros gastos de interesse partidário, “conforme deliberação da executiva do partido político”. Projeto proíbe uso de recursos do fundo para pagar multas aplicadas aos partidos, em caso de dolo específico comprovado (intenção de cometer o crime). Isso vale para atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, como multa de mora, atualização monetária ou juros. A distribuição dos recursos segue a proporção dos votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados (lei prevê 5% distribuídos igualmente a todos os partidos que cumpriram essa cláusula e o restante pelo critério de votos).
– Fundo Eleitoral
Valores serão distribuídos em percentuais iguais aos definidos atualmente, levando em consideração o número de eleitos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
– Empresas
Partidos podem contratar empresas privadas para auditar prestação de contas utilizando recursos do fundo partidário.
– Votos para mulheres, negros e indígenas
Os votos de mulheres, negros e indígenas serão contados em dobro no momento da distribuição dos recursos do fundo partidário.
– Poderes do TSE
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passa a ter poder limitado na regulamentação das normas eleitorais. A partir de agora, o Congresso Nacional pode sustar resoluções do TSE que considerar exorbitantes do poder regulamentar – a exemplo do que ocorre com atos do Poder Executivo.
– Coligações
Coligações entre partidos para cargos proporcionais (deputados e vereadores) seguem proibidas, segundo o código (seguindo a Emenda Constitucional 97, de 2017). Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) revertendo essa proibição passou, em agosto deste ano, na Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado.