O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques autorizou, em decisão proferida nessa segunda-feira, o motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva, citado em relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre a empresa de logística VTCLog, a não comparecer ao depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid. O depoimento de Ivanildo é previsto para esta terça.
O relatório do Coaf analisa as contas da empresa entre janeiro de 2018 e julho deste ano e mostra que o motoboy, apontado como funcionário da VTCLog, chegou a sacar, neste período, mais de R$ 4,5 milhões em espécie.
Caso o depoente opte por comparecer, Nunes Marques concedeu “o direito ao silêncio, podendo não responder, se assim preferir, a perguntas a ele direcionadas; o direito à assistência por advogado durante o ato; o direito de não ser submetido ao compromisso de dizer a verdade ou de subscrever termos com esse conteúdo; e o direito de não sofrer constrangimentos físicos ou morais decorrentes do exercício dos direitos anteriores”.
O relatório do Coaf registra que diversos saques da empresa sugerem “artifício de burla”, sinalizando que eram sacados valores de até R$ 49 mil, próximo ao limite legal de R$ 50 mil para comunicação de movimentação em espécie ao Conselho.
“Trata-se de empresa que realizou saques em espécie de valores que aparentam artifício de burla para identificação do destino dos recursos”, pontua o documento obtido pelo portal R7. Em uma das contas, a análise envolveu o período de novembro de 2020 a janeiro de 2021. A justificativa para os saques é o pagamento de prestação de serviços. O órgão salienta, no relatório, que existem outros meios de transferência de recursos, além do saque em espécie.
Ivanildo teve convocação aprovada pelos senadores na última quarta-feira. Na reta final dos trabalhos, a comissão ainda quer apurar melhor as relações da empresa com figuras ligadas ao governo federal. A VTCLog firmou diversos contratos com órgãos do governo, dentre eles com o Ministério da Saúde.
Na decisão, o ministro alega que “a condição de investigado impede que se exija do impetrante o compromisso de dizer a verdade, garantindo-lhe, ainda, o direito ao silêncio e à assistência de advogado”. Mas apontou jurisprudência em que o ministro Gilmar Mendes votou que “o comparecimento perante a CPI, para ser ouvido, é uma faculdade do investigado”.
Nunes Marques pontuou, então, que “além da faculdade que lhe é conferida de optar por comparecer, ou não, ao depoimento deferido pela Comissão”, inexiste “congruência/conexão entre as justificativas para a convocação e os motivos determinantes para a instalação da CPI da Pandemia”.
“Não há, assim, congruência entre os fatos determinantes da abertura da CPI ― políticas públicas no enfrentamento da pandemia que alcançou o Brasil em 2020 ― e aqueles que serviram de fundamento para a convocação do impetrante: movimentação financeira da VTClog sem determinação do período; saques pelo impetrante, nos últimos dois anos, de altos valores destinados a sua empregadora; relação de confiança da empresa VTClog com o impetrante; e transporte, em sua moto, de R$ 430 mil, em 24 de dezembro de 2018, ‘noite de Natal'”, escreveu o ministro.
CPI vai recorrer
O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD/AM), disse ao R7 que a CPI vai recorrer da decisão. “O ministro [Nunes Marques] alegou que não haveria nexo a convocação de Ivanildo Gonçalves da Silva. Nosso entendimento é diferente e nosso papel é recorrer da decisão, com o devido respeito ao ministro”, afirmou.
O senador Humberto Costa (PT/PE) também defendeu o recurso. “Avaliamos que o comparecimento dele é importante, pois ele tem informações extremamente relevantes. Pediremos ao Pleno do Supremo que avalie a decisão, até porque a autorização de não comparecimento é inédita nesta CPI. Vamos pedir que seja reavaliado”, comentou.
Ainda de acordo com o Costa, caso o STF mantenha a decisão de dar o direito a Ivanildo Gonçalves da Silva o direito de não comparecer, a sessão desta terça vai contar com discussões entre os senadores.