Famílias da classe D sofreram mais impactos negativos durante pandemia

Grupo se sente mais triste, ansioso e sobrecarregado que os demais

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Famílias da classe D, com renda familiar média mensal de R$ 720, foram as mais negativamente impactadas pela pandemia de Covid-19 no que se refere aos cuidados com as crianças de até 3 anos. O grupo específico se sente mais triste, ansioso, sobrecarregado, exausto, impaciente e assustado que os demais. As famílias dizem que o fator financeiro é um ponto de atenção na forma como cuidadores de crianças vêm lidando com a pandemia.

As informações fazem parte da pesquisa Primeiríssima Infância – Interações na Pandemia: Comportamentos de pais e cuidadores de crianças de 0 a 3 anos em tempos de Covid-19, que, nos próximos dias, vai ser divulgada na íntegra.

A pesquisa, realizada pela Kantar Ibope Media, a pedido da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, contou com a participação de famílias das classes sociais A, B, C e D, que convivem e são responsáveis por crianças de 0 a 3 anos. Ao todo, 1.036 pessoas participaram das entrevistas, feitas, em maioria, de forma online com o auxílio de uma plataforma, em março.

“Com o isolamento social e uma natural crise socioeconômica, a gente percebe, pela pesquisa, o agravamento dessas oportunidades, os efeitos perversos da desigualdade e como esses ambientes e estímulos conseguem fazer o desenvolvimento [da criança] avançar ou retroceder”, declara a CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Mariana Luz.

Mariana explica que os primeiros anos de vida das crianças constituem oportunidade única e decisiva para o desenvolvimento de todo ser humano. Nessa etapa, são feitas conexões que vão embasar as estruturas cerebrais e contribuem para a aprendizagem, além de criar condições para a saúde e a felicidade delas no presente e no futuro. Por isso, tanto a primeiríssima infância, até os 3 anos, e a primeira infância, até os 6 anos, exigem atenção.

A especialista enfatiza ainda a necessidade de cuidar de quem cuida. “Os cuidadores e pais devem estar bem para conseguir oferecer e estar disponíveis para que a interação aconteça. O desenvolvimento acontece por meio da interação”, completa. No Brasil, cabe aos municípios fornecer a educação de base, incluindo as creches para crianças até 3 anos de idade.

Resultados

As situações vividas pelas famílias na pandemia são distintas, e a percepção em torno do trabalho de cuidar de crianças pequenas também muda, de acordo com a classe social de quem respondeu ao estudo. Aqueles que puderam trabalhar em casa, por exemplo, relataram mais tempo de convivência das mães, pais e responsáveis com as crianças durante a pandemia.

Isso ocorreu, sobretudo, nos segmentos de classe e educação mais elevados: 51% da classe AB1 – com renda familiar média mensal acima de R$ 11,3 mil – relataram que tiveram boas oportunidades de convivência com as crianças na pandemia. Essa porcentagem cai para 33% entre as famílias da classe D. Nesse grupo, a maioria, 52%, relatou que não houve alteração no tempo de convivência.

A pesquisa alerta que, apesar do tempo de convivência dos pais com os filhos não ter sido alterado para classe D, ele pode estar mais precário devido à sobrecarga e ao acúmulo de funções.

As mudanças na rotina tiveram efeitos também nas crianças. Cerca de uma em cada quatro (27%), de todas as classes, apresentou regressão neste um ano de pandemia. Isso significa que voltaram a ter comportamentos de quando eram mais novos, como chorar muito, fazer xixi na roupa sem pedir para ir ao banheiro e falar menos. O uso mais frequente de equipamentos eletrônicos também pode ter impactado no desenvolvimento.

O acesso à informação e a políticas públicas e a sensação de amparo também foram sentidas de forma diferente a depender da classe social da família. A maior parte (64%) da classe B2C Básica – que corresponde às famílias com renda média mensal entre R$ 1,7 mil e R$ 5,6 mil que cursaram até o ensino médio – e da classe D (70%) tiveram acesso à renda emergencial. O índice de visita domiciliar por programas sociais, como o Saúde da Família, ficou em cerca de 20% em todos os grupos da pesquisa.

Os benefícios recebidos dão, no entanto, sensação de amparo principalmente para os grupos de educação elevada. Na classe AB1, 58% sentiram-se amparados. A menor porcentagem, 32%, é de famílias da classe D. Já com relação a informações recebidas durante esse período, a classe AB1 se destaca como a que mais recebeu enquanto a D foi a com menor percentual registrado, respectivamente 22% e 10%.