O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ficou isolado no início do segundo depoimento na CPI da Covid, tendo sido contrariado até por aliados do presidente Jair Bolsonaro. Queiroga afirmou que não há provas de que a cloroquina tenha eficácia contra a Covid-19 e que não há nenhum infectologista trabalhando na pasta.
Durante a sessão da CPI, o ministro deu a declaração mais enfática até o momento sobre o chamado tratamento precoce da Covid-19, com o uso de medicamentos como a hidroxicloroquina e a ivermectina. “Senador, eu já respondi a Vossa Excelência, essas medicações não têm eficácia comprovada. Não têm eficácia comprovada”, disse ao relator, Renan Calheiros (MDB-AL).
O ministro também falou que a credibilidade do Ministério da Saúde junto a entidades e cientistas está “absolutamente intacta”. “Temos o apoio de entidades e instituições universitárias”. Apesar da declaração, Queiroga citou que há médicos, na “linha de frente”, relatando “casos de sucesso com esses tratamentos”.
De acordo com Queiroga, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), órgão responsável por analisar protocolos de tratamentos, decide nesta quinta-feira, 10, sobre as recomendações para o tratamento hospitalar da Covid-19. No mês passado, a comissão técnica havia decidido por não recomendar o uso de medicamentos como a cloroquina, sem eficácia comprovada, para o tratamento da doença no Brasil.
Divergências na base governista
O chamado tratamento precoce é defendido por Bolsonaro e pela tropa de choque do Palácio do Planalto na CPI da Covid. O comentário de Queiroga provocou críticas do senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS), que assumiu uma vaga de titular na comissão após a viagem do senador Ciro Nogueira (PP-PI) ao exterior nesta semana. “Nós vamos apoiar a vacina, sim, mas não podemos desqualificar o tratamento precoce”, disse Heinze.
O ministro declarou que não questiona a legitimidade de médicos pró-cloroquina, mas que o protocolo sobre o tratamento precisa ser resolvido no ambiente científico e, “de uma vez por todas”, pacificado. O protocolo sobre a medicação pode ser concluído em “curto período de tempo” pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (Conitec), disse Queiroga. Ele se negou, porém, a retirar do site do ministério uma nota que recomenda a administração da cloroquina desde os primeiros sinais da doença.
Outro defensor do governo, Eduardo Girão (Podemos-CE) também criticou o posicionamento contrário ao tratamento precoce. Girão ressaltou, porém, que não concorda com o comportamento de Bolsonaro ao promover aglomerações.
Outra divergência com a base governista envolveu o quadro de servidores do Ministério da Saúde. “O Ministério da Saúde, ao longo do tempo, tem perdido quadros. Nós não temos, no Ministério da Saúde, médicos infectologistas. Temos a doutora Carolina, que é médica infectologista, mas ela é servidora da CGU. Ela não está ali na função de médica infectologista. O que nós temos são médicos consultores, que nos apoiam”, disse o chefe da pasta.
Aliados de Bolsonaro, Heinze e Marcos Rogério (DEM-RR) rebateram. “O Ministério da Saúde tem, pelo menos, sete infectologistas”, disse Rogério, sendo retrucado pelo relator em seguida. “Então, o ministro está mentindo? Respeita o ministro, rapaz”, afirmou Renan a Marcos Rogério.
Para o senador Humberto Costa (PT-PE), a situação de Queiroga mostra que ele pode estar prestes a deixar o ministério da Saúde. “Eu até vejo que aqui, quando vêm algumas pessoas, vem gente de todo canto para defender, não é verdade? Até o senador Flávio Bolsonaro vem aqui. Hoje, cadê o Ciro Nogueira? Cadê os outros? Vossa Excelência está só aí. Está abandonado aqui”, disse o petista. Apesar de ter a autonomia questionada, Queiroga reforçou que Bolsonaro está “preocupado” com questões sanitárias e “apoia” as ações do ministério, especialmente a vacinação.
“Ainda estamos na 2ª onda”
O ministro afirmou, ainda, que “até o momento, não está caracterizada a terceira onda” de contaminações pela Covid-19 no País. “Estamos ainda nessa segunda onda com um platô elevado de casos e a minha esperança para conter isso é a vacina”, disse.
Sobre o contenção do avanço da doença no Brasil, o ministro afirmou que a cada duas semanas há uma reunião do gabinete de crise da qual participa o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
“Com o presidente (Jair Bolsonaro) despacho sempre com ele, pelo menos uma vez por semana estou com o presidente especificamente para tratar sobre saúde”, completou.
Defesa da eficácia dos protocolos da Copa América
Marcelo Queiroga voltou a dizer que não partiu dele, nem do Ministério, a decisão de realizar a Copa América no Brasil. O ministro afirmou, entretanto, que avalia como seguros e eficazes os protocolos para a realização da competição esportiva. O assunto gerou um bate-boca entre os senadores que compararam a Copa América com os demais campeonatos de futebol, e de outros esportes, permitidos no país.
Ao ser questionado sobre os envolvidos no evento, Queiroga disse que não considera exposição em massa a realização da Copa América. Contudo, chegou a sugerir que campeonato ocorra sem a imprensa, para reduzir o número de pessoas expostas a um possível contágio.
Nessa segunda-feira, o Ministério da Saúde apresentou os protocolos para a realização do evento, entre os quais se inclui a testagem das equipes a cada dois dias para a detecção eventual do novo coronavírus.
Aposta na vacina nacional
Queiroga voltou a defender o uso de vacinas desenvolvidas e produzidas em território nacional como a saída de longo prazo para a crise sanitária causada pelo novo coronavírus. À CPI da Covid no Senado, ele destacou nesta terça-feira que o Brasil “deve apostar no futuro em vacina nacional”.
Durante a fala à Comissão Parlamentar de Inquérito, Queiroga afirmou que já existem conversas pelo ministério para a compra de vacinas para nova rodada de imunização. “Minha opinião pessoal é de que precisaremos (de vacinação regular)”, defendeu.