Pesquisa: maioria dos brasileiros considera país preconceituoso, mas não se julga racista

Amostragem, encomendada pelo Grupo Carrefour, ouviu 1.630 pessoas, por telefone, entre 15 e 20 de abril

Foto: Wilson Dias/ABr

Uma pesquisa encomendada pelo Grupo Carrefour Brasil e aplicada pelo Instituto Locomotiva, com entrevistados em mais de 72 cidades brasileiras, mostra que a maioria dos entrevistados considera o país preconceituoso com as pessoas negras, mas, individualmente, não se julga racista.

Os dados foram divulgados na tarde desta quarta-feira. A amostragem ouviu 1.630 pessoas, por telefone, entre 15 e 20 de abril. A margem de erro é de 2,1%, em um intervalo de confiança de 95%.

Sobre o racismo no país, 84% disseram considerar o Brasil preconceituoso em relação às pessoas negras, mas esse percentual varia: entre as pessoas negras, a percepção cresce para 89% e, apenas entre as pessoas brancas, cai para 74%. Só 4%, porém, admitem já ter agido de forma preconceituosa.

A sondagem também revela que 85% dizem se posicionar contra o racismo e que 61% já presenciaram uma pessoa negra sendo humilhada ou discriminada devido à raça ou cor em lojas, shoppings, supermercados ou restaurantes. Entre pessoas negras, o percentual volta a crescer, chegando a 71%.

Sobre a questão da violência contra as pessoas negras, 89% dos brasileiros reconhecem que elas sofrem mais violência física. Na comparação entre pessoas negras e brancas abordadas pela polícia, 54% dos negros ouvidos pela pesquisa disseram já ter sido parados na rua por oficiais, enquanto entre as pessoas brancas a marca é de 29%.

Apenas entre as pessoas negras, 41% contaram ter sido abordadas mais de 5 vezes e mais de 50% delas se sentiram desrespeitadas pelas autoridades. Cerca de 20% já relataram ter sofrido até mesmo agressões físicas durante essas abordagens.

Os reflexos do racismo também aparecem no mercado de trabalho. Para 76% dos participantes da sondagem, as pessoas negras são discriminadas pelos empregadores, inclusive ganhando salários bem menores. Para 56%, há pouca ou nenhuma diversidade de raça/cor nas empresas, com pessoas brancas em 73% dos cargos de chefia.

Já no ambiente de trabalho, 52% dos trabalhadores pretos e 26% dos negros e pardos já sofreram preconceito no ambiente de trabalho. Do total de entrevistados, 57% já presenciaram uma pessoa negra sendo discriminada ou humilhada no ambiente de trabalho. Percepção que, entre os negros, aumenta para 67%.

Para 92%, são maiores as chances de uma pessoa branca conseguir um emprego atualmente no Brasil. Um grupo também expressivo, de 86%, vê mais chances de que brancos ingressem em um curso superior.

De acordo com dados do IBGE, 56% dos brasileiros são negros, com 99 milhões se autodeclarando pardos e 20 milhões pretos, para uma população de cerca de 213 milhões de habitantes.

Grande parte da população negra do país se concentra nas regiões norte e nordeste do Brasil, estimando-se assim que cerca de 48% dessa população esteja nessas localidades.

Em maioria, os negros pertencem às classes mais pobres e vulneráveis, sendo 52% pertencentes à classe C e 29% às classe D e E. Apenas 19% da população negra está inclusa no recorte das classes mais altas, A e B.

O Carrefour divulgou, nesta quarta, o andamento de uma série de ações afirmativas contra o preconceito racial, incluindo a realização da sondagem. Passados cinco meses da morte de João Alberto Silveira Freitas, o Beto, de 40 anos, no estacionamento da loja do bairro Passo D’Areia, em Porto Alegre, a multinacional busca enfrentar a rejeição e o “cancelamento” desde os protestos que se seguiram ao crime.

Em uma live de cerca de quatro horas, a empresa ressaltou que assumiu a responsabilidade pelo ocorrido, afastando responsáveis, reavaliando o comportamento dos funcionários e rompendo o contrato com a empresa de segurança que fazia o serviço na ocasião.

O Ministério Público denunciou seis pessoas pelo crime, entre eles, Magno Braz Borges e Giovane Gaspar da Silva, que participaram efetivamente nas agressões que tiraram a vida de Beto. A perícia classificou como morte por asfixia.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal negou habeas corpus a Giovane, que também era policial militar temporário.

Carrefour deposita indenização à viúva

Nesta quarta, o Carrefour Brasil depositou, deliberadamente, R$ 1 milhão para a viúva de João Alberto. O valor é a soma do patamar máximo por danos morais fixado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) para casos como este e de um valor referente aos danos materiais, independentemente da comprovação necessária em caso de litígio.

A empresa ainda depositou R$ 100 mil extras para gastos urgentes. Além do pagamento da indenização, o Carrefour já havia finalizado oito acordos com os demais familiares da vítima.

Desde a morte de João Alberto, a empresa manteve assistência financeira e psicológica à disposição, incluindo uma assistente social e os gastos do dia a dia (supermercados, aluguéis, transportes e educação, por exemplo).

Ressarcimento à sociedade

O Carrefour também negocia junto ao Ministério Público do Rio Grande do Sul e outras autoridades uma indenização por danos morais coletivos, por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), estabelecendo compromissos e obrigações da empresa com a sociedade para a luta contra o racismo no país. O site Não Vamos Esquecer reúne todas as ações do Carrefour sobre a causa.