Dados divulgados pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib), mostram que em março, pela primeira vez desde o início da pandemia, pacientes com menos de 40 anos são a maioria dos internados em unidades de terapia intensiva (UTI) do Brasil. O levantamento aponta que quase 60% dos que estiveram internados são de adultos com até 40 anos.
Em Porto Alegre, desde final do mês de fevereiro, hospitais também têm indicado esta mudança no perfil dos pacientes. Com o avanço da vacinação nos grupos prioritários, o que inclui pessoas acima dos 60 anos, especialistas afirmam que é questão de tempo que esta estatística se estenda à mortalidade.
O estudo da Amib revelou que, no último mês mais de 58,1% das internações em UTI foram de adultos com até 40 anos, num total que ultrapassa os 20 mil leitos. A pesquisa foi feita a partir de uma amostra que englobou 20.865 leitos de UTI no país, cerca de 25% de todas as unidades.
Quando feita uma comparação com os meses anteriores, os pacientes mais jovens representavam cerca de 45% dos internados. Enquanto isso, a ocupação de idosos acima dos 80 anos nas UTIs caiu 42%, aponta o estudo.
“Sim, no Rio Grande do Sul também ocorreu uma mudança na epidemiologia da Covid no RS, passando os jovens a ter uma participação maior nas internações hospitalares em relação aos períodos anteriores”, atesta o infectologista e professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Alessandro Pasqualotto.
No Hospital de Clínicas de Porto Alegre, que atende pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a média de idade de pacientes com Covid-19 admitidos em 2020 foi de 57,5 anos. Em 2021, janeiro apresentou média de 56 anos, fevereiro de 54,4 e culminando com março de 51,4 anos. Mas se considerando apenas aqueles admitidos em leitos do Centro de Terapia Intensiva (CTI), a queda é mais acentuada: enquanto a média de idade era próxima de 60 anos em 2020 e em janeiro de 2021, foi de 56,6 anos em fevereiro e de 50,7 em março. Ou seja, praticamente dez anos a menos.
No Hospital Moinhos de Vento, que atende particular e planos de saúde, a média geral de idades de todos os pacientes internados por Covid-19 passou de 61 anos em dezembro para 57 em abril. Na faixa etária dos 20 aos 40 anos, a quantidade de pacientes internados em enfermaria aumentou 78% e na UTI, 900%, quando havia apenas um paciente e aumentou para 10 entre novembro do ano passado e março deste ano.
Na faixa etária dos 41 aos 60 anos, a quantidade de pacientes aumentou 85% na enfermaria e na UTI, foi um avanço de 107%. Na comparação no mesmo período, as internações no CTI de pessoas com 61 a 80 anos de idade aumentaram 93%. Já na faixa acima dos 80 anos, que coincidiu com o período em que havia iniciado a vacinação contra a Covid-19 para esta faixa etária, foi só de 18%.
“Uma destas explicações passa pela vacinação dos idosos, tendo algum efeito, mas acima de tudo, se explicaria pela maior exposição dos jovens nesta pandemia e por este motivo estão pegando mais o vírus”, explica Pasqualotto.
O professor de Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Paulo Petry, também concorda com o infectologista. “Aí entra a questão das vacinas. E Porto Alegre já está vacinando as pessoas com mais de 61 anos. As pessoas de 70, 80 anos ou mais já têm a segunda dose e a imunização mais completa e em caso de contraírem o vírus, passarão agora a não agravar a doença a ponto de ter internação”, coloca.
Mas Petry também faz uma ponderação. “Isso precisa ser melhor avaliado, mas parece ser pelo espalhamento da cepa de Manaus, a P.1, que começou a se transmitir mais rapidamente a partir do verão, do carnaval e os jovens, de uma maneira geral, se expuseram e passaram a adoecer cada vez mais”, acredita.
Olhando para frente, Petry prevê que a predominância dos jovens nas estatísticas da Covid-19 deve também migrar para a mortalidade. “Isso indica uma tendência. Mas a mortalidade é ainda maior nas pessoas com mais idade, mas que com as reduções nas internações, essa média também vai se refletir nas mortes pela doença”, detalha Petry.
Além da questão da idade, Pasqualotto também vê que os protocolos de bandeira preta ajudaram, de alguma forma, a reduzir a circulação do vírus no estado, o que é bom, mas ele reforça que as precisam manter os cuidados. “Também diria que ficou muito evidente o efeito das medidas restritivas na bandeira preta no estado. À medida que vai se relaxando, em que a gente vai reabrindo a sociedade, então a preocupação passa a ser como será a próxima fase da Covid-19 no estado. Assumindo que as pessoas estejam mais educadas em como se comportar neste momento da pandemia, vamos ter momentos mais tênues e não tão graves como foi este”, conclui.