Prestes a retomar o modelo de cogestão e o funcionamento de serviços não essenciais, o Rio Grande do Sul poderá se deparar com novas variantes do coronavírus. Especialistas ligados à Secretaria Estadual da Saúde (SES) alertam que a diminuição do isolamento social gera um cenário “muito propício” para que o vírus circule e acumule novas mutações. A linhagem P1, descoberta em Manaus e registrada pela primeira vez em território gaúcho em 14 de janeiro deste ano – antes da chegada de pacientes vindos do Norte do país -, tem sido um dos principais agravantes que levou o sistema hospitalar gaúcho a uma das piores situações no país.
Apesar do período de bandeira preta, que, segundo o governador Eduardo Leite, trouxe indicadores de redução da demanda hospitalar, cientistas consideram que nas últimas semanas a população não aderiu ao nível de isolamento que o momento necessita. “As restrições são muito semelhantes às do início da pandemia, mas é visível na rua que a mobilidade urbana está elevadíssima”, comenta o especialista em Saúde do Laboratório Central do Estado (Lacen-RS), Richard Salvato.
Resultado de um processo natural de mutações de todos os vírus, uma nova linhagem pode aumentar a capacidade do coronavírus se ligar às células humanas e a transmissibilidade, como tem ocorrido com algumas das variantes que circulam em território gaúcho. De acordo com a bióloga Tatiana Gregianini, especialista em Saúde e responsável pelo diagnóstico de vírus respiratórios do LACEN/CEVS/SES-RS, o surgimento de novas linhagens é esperado quando há circulação de pessoas. “Enquanto não tiver uma quantidade bastante maior de vacinas aplicadas, vamos ver essas oscilações. O ambiente que temos é muito propício para isso.”
Variante P1 explica agravamento da pandemia no RS
O relaxamento de medidas de restrição durante o final de 2020 e o início de 2021, com concentração de pessoas em regiões como praias, é um dos fatores que levou a colapsos no sistema de saúde por todo o Brasil. A situação do Rio Grande do Sul, no entanto, é ainda mais grave que a de estados como o Rio de Janeiro, onde o turismo é constante e as aglomerações vinham sendo denunciadas antes mesmo do verão. A explicação, segundo os especialistas, é o maior impacto da variante P1 em território gaúcho.
Descoberta em Manaus, em novembro de 2020, a linhagem P1 tem transmissão mais rápida, explica Salvato. A variante P2, que surgiu no Rio de Janeiro, segundo ele, apesar de carregar uma mutação que também facilitaria a entrada do vírus nas células humanas, não registrou uma transmissibilidade tão elevada. Ao todo, a linhagem foi registrada em 16 estados brasileiros. A variante foi identificada pela primeira vez em solo gaúcho em Gramado, no dia 14 de janeiro. A pessoa infectada era moradora da cidade e não havia viajado ou tido contado com alguém da região Norte do país.
Nesse caso, não há como fazer o rastreamento completo do surgimento da linhagem e a hipótese mais provável é de que ela já estivesse circulando na região, que se caracteriza pelo turismo ao longo de todo o ano. A partir do momento em que há transmissão local, o número de casos acaba crescendo mais rápido, principalmente quando não há isolamento social. “Se essa linhagem tivesse aparecido num momento de distanciamento controlado, talvez não achasse o espaço para circular tanto”, avalia Tatiana Gregianini.