Pazuello contraria AGU e nega ter sido avisado sobre falta de oxigênio

Segundo ministro, informações que chegaram à Pasta diziam respeito a “dificuldades técnicas” na distribuição do produto

Foto: Tomaz Silva / Agência Brasil / Divulgação

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse ao Senado nesta quinta-feira não ter sido avisado sobre um eventual colapso no fornecimento de oxigênio aos hospitais de Manaus (AM). Segundo ele, as informações que chegaram ao ministério diziam respeito a “dificuldades técnicas” na distribuição do produto, área que segundo ele não é de competência da União.

A afirmação, no entanto, contraria manifestação da Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhada ao Supremo Tribunal Federal em janeiro, segundo a qual o Ministério da Saúde teve ciência do problema no dia 8 do mesmo mês. O documento atesta que a pasta havia sido informada da “crítica situação do esvaziamento de estoque de oxigênio em Manaus” por meio de e-mails enviados pela empresa fabricante.

Pazuello citou um relatório da Força Nacional do SUS [Sistema Único de Saúde], entregue no dia 9 de janeiro, mencionando problemas na “pressurização” do oxigênio para os hospitais.

“Os fatos relatados, puros e secos, indicam deficiência na gestão dos hospitais por dificuldades técnicas em redes de gases. Em momento algum fala-se sobre falta de oxigênio, colapso de oxigênio ou previsão de falta de oxigênio. Rede de gases são os tubos, e não o oxigênio que vai dentro. Pressurização entre o município e o estado é [questão de] regulação entre um e outro. O Ministério da Saúde não tem qualquer competência para fabricação, transporte e distribuição de oxigênio”, disse.

Além disso, Pazuello afirmou que a fabricante de oxigênio apresentou essas “dificuldades logísticas” apenas no dia 11, quando o ministro já havia chegado a Manaus.

A explicação desta quinta também vai de encontro a declarações anteriores feitas por Pazuello, em entrevista coletiva concedida no dia 18 de janeiro. Na ocasião, ele havia informado que um comunicado da empresa fabricante de oxigênio para Manaus, feito no dia 8 daquele mês, alertou para a possibilidade de falta do insumo nos hospitais do Amazonas.

Ação
Apesar de entender que o Ministério da Saúde não tinha a responsabilidade imediata de agir sobre a crise de abastecimento de oxigênio no Amazonas (ou em qualquer outra unidade da federação), Pazuello declarou ter agido assim porque o estado é “a casa” dele.

“É muito estranho quando ouvimos a possibilidade de nós não tomarmos atitudes imediatamente com relação à nossa cidade, com relação à nossa família. A minha ação é porque era Manaus, está bem? Faço aqui a mea-culpa”, resumiu o ministro, que comandou a 12ª Região Militar, sediada na cidade, e mantém família na capital amazonense.

Ele afirmou que foram conversas com esses parentes que o alertaram para o agravamento da situação, e que por isso começou a articular uma reação. O ministro relatou que promove reuniões com a equipe sobre o assunto desde o final de 2020. A primeira, de acordo com ele, ocorreu em 28 de dezembro, com todos os secretários do ministério. Essa reunião não consta da agenda oficial do ministro para a data. Nesse encontro, Pazuello disse ter iniciado uma articulação para enviar equipes ao Amazonas.

No dia 6 de janeiro, Pazuello relatou ter se reunido com o governador do Amazonas, Wilson Martins. Também contou ter ocorrido, no dia seguinte, uma conversa por telefone entre os dois. Segundo Pazuello, em nenhuma dessas ocasiões houve menção à situação dos hospitais, mas a Secretaria de Saúde do estado pediu auxílio no transporte de oxigênio de Belém (PA) para Manaus.

Outra reunião com todo o secretariado, conforme o ministro, ocorreu em 8 de janeiro, ocasião em que Pazuello garante ter ordenado o embarque de todos os secretários da pasta com ele, para Manaus. Essa reunião também não está registrada na agenda do ministro.

Números
O Amazonas enfrenta a maior letalidade da Covid-19 no Brasil. O estado registra uma taxa de 224,64 mortes pela doença a cada 100 mil habitantes, a mais alta do país. Ela é cerca de 26% maior do que a do Rio de Janeiro, segundo colocado, e cerca de 50% maior do que os índices registrados em todos os demais.

Mesmo assim, Pazuello disse que o Ministério da Saúde começou “a ganhar a guerra” quando assumiu a articulação das ações de saúde no estado no fim de janeiro. No entanto, o ministro alertou para a disseminação da nova cepa do coronavírus identificada na região Norte. Segundo ele, essa nova versão do vírus já está nos estados do Amapá e do Pará, e a cidade de Belém segue “o caminho do ano passado”.

Para Pazuello, a disparada nos casos de Covid-19 no Amazonas entre o fim de 2020 e o início de 2021 era imprevisível. O estado, afirmou, tinha taxas de contágio abaixo da média semestral na última semana de avaliação epidemiológica do ano passado, mas registrou um aumento “vertical” nos primeiros dias deste ano.

“Esperava-se que houvesse um novo aumento dessa contaminação neste momento, e nós estávamos preparados para isso, mas não para o tamanho do impacto e da curva que aconteceu. Ninguém estava”, assegurou.

As afirmações do ministro foram rebatidas pelo líder do MDB, senador Eduardo Braga (AM), que relatou ter antecipado os problemas ao ministro.

“Eu estive com Vossa Excelência, no seu gabinete, em dezembro. Eu já dizia que nós iríamos enfrentar uma onda no Amazonas muito grave. Sugeri, inclusive, que assumisse uma unidade hospitalar no Amazonas, diante da comprovação da ineficiência do governo do meu estado. Eu dizia a Vossa Excelência que, se não tomasse providências para assumir a execução, não seria executado. Isso nós já sabíamos quando da primeira onda”, declarou o senador.

Eduardo Braga também rejeitou a versão do ministro para as comunicações sobre os problemas de oxigênio do Amazonas. Segundo o parlamentar, a rede de pressurização de oxigênio entre estado e municípios, apontada por Pazuello como a causa do problema, não existe, e o desabastecimento de oxigênio é real.

“Não é possível dizer que a falta de oxigênio no Amazonas foi em função de falta de pressão entre redes inexistentes. Isso não é verdade. A capacidade de geração de oxigênio no meu estado é em torno de 30 mil toneladas, e o consumo explodiu para 70 mil.”

Outra crítica do senador se referiu à declaração de que o Ministério da Saúde havia controlado a situação. Eduardo Braga disse que os registros de óbitos no estado seguem defasados, e que doentes que morrem em casa, por impossibilidade de atendimento hospitalar, não vêm sendo contabilizados nas estatísticas da Covid-19.

O senador Omar Aziz (PSD-AM) também questionou o ministro sobre a efetividade das ações da pasta. “Está caindo um boeing por dia no meu estado. Morrem 200 pessoas por dia. Em qualquer lugar do mundo, isso é notícia. Se cair um boeing hoje numa república pequena, em qualquer lugar do mundo, isso vira manchete em qualquer jornal do país. Isso está acontecendo diariamente no estado do Amazonas.”

Pazuello não contestou as afirmações dos senadores.