CNMP apura conduta de promotor em caso de estupro em SC

Órgão informou que reclamação disciplinar tramita desde 9 de outubro

Foto: Reprodução/Correio do Povo

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) informou que apura desde outubro a conduta do promotor Thiago Carriço de Oliveira no julgamento que absolveu o empresário André de Camargo Aranha da acusação de estupro da influenciadora digital Mariana Ferrer, em Santa Catarina.

A manifestação do CNMP saiu hoje, após quatro conselheiros do órgão terem pedido providências diante da divulgação, pelo site The Intercept Brasil, do vídeo de uma audiência em que o advogado de Aranha humilha Mariana Ferrer, sem que o promotor esboce reação.

Em nota, o órgão disse que uma reclamação disciplinar tramita contra o promotor, sob sigilo, desde 9 de outubro, motivada por uma representação feita pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

“A Corregedoria Nacional do MP solicitou informações à Corregedoria do Ministério Público de Santa Catarina sobre o caso. Após recebê-las, serão analisadas as providências que serão tomadas”, cita a nota do CNMP.

Em outra frente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apura a conduta do juiz Rudson Marcos, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ao conduzir as audiências do caso. A seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SC) também disse ter oficiado o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho.

Audiência
Na gravação da audiência divulgada pelo The Intercept Brasil, o advogado aparece expondo fotos sensuais de Mariana sem conexão com o caso e ataca a dignidade da influencer. Em dado momento, Gastão da Rosa Filho descarta a hipótese de ter uma filha “no nível” de Mariana e que antes do ataque, havia postou fotos em “posições ginecológicas”, entre outras acusações.

Em nenhum momento, magistrado e promotor tentaram interromper Gastão da Rosa Filho. A fala do defensor somente se encerra após Mariana, aos prantos, implorar pela interrupção da sessão.

Em nota, a OAB-SC disse que “atua no sentido de coibir desvios éticos” e que oficiou o advogado a prestar “os esclarecimentos preliminares necessários para o deslinde da questão”. O processo tramita sob sigilo no Tribunal de Ética e Disciplina do órgão.

Entenda o caso
Mariana Ferrer acusou o empresário André de Camargo Aranha de tê-la dopado em 2018 durante uma festa na boate da qual era promoter, em Florianópolis. De acordo com a influencer, Aranha também tirou a virgindade dela em um momento no qual não tinha capacidade de resistir.

O juiz responsável, ao absolver o empresário, acatou o pedido do Ministério Público de Santa Catarina, que após apresentar a denúncia, mudou de posição, passando a argumentar pela falta de provas e a inocência de Aranha.

Em alegações finais, o promotor Thiago Carriço de Oliveira disse que, no entender do MPSC, a instrução processual havia demonstrado não haver provas de que Mariana havia sido dopada, e que Aranha não tinha como saber se ela era capaz de consentir a relação sexual. Por esse motivo, entendeu não haver dolo no suposto estupro.

O caso teve peculiaridades incomuns, como a troca do promotor responsável ao longo do processo. Em nota, o MPSC nega que Thiago Carriço de Oliveira tenha defendido a tese de que houve estupro sem intenção, ou “estupro culposo”, expressão utilizada pelo The Intercept Brasil para descrever a conclusão das investigações do Ministério Público.

O CNMP acrescentou repudiar a conduta do advogado durante audiência do caso.

Repercussão
Ontem, após serem divulgados trechos em vídeo da audiência por videoconferência, o caso gerou repercussão no mundo político e jurídico. O Senado aprovou uma nota de repúdio contra a conduta do advogado, do promotor e do juiz envolvidos no julgamento, “expondo a vítima a sofrimento e humilhação”.

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também se manifestou sobre o caso no Twitter. Ele taxou as cenas da audiência de “estarrecedoras” e afirmou que o sistema de Justiça não pode servir à “tortura e humilhação”.

Ainda na terça-feira, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos divulgou nota sobre o julgamento onde manifesta “veemente repúdio ao termo ‘estupro culposo'” e garantindo que acompanha o “recurso já interposto pela denunciante em segundo grau, confiando nas instâncias superiores”.