CNJ avalia investigar juiz que inocentou empresário acusado de estupro em Santa Catarina

Conselho alega que juiz não interveio quando advogado do acusado mostrou fotos da vítima dizendo que ela tinha "a desgraça dos outros" como "ganha pão"

Foto: Gil Ferreira / Agência CNJ

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai analisar um pedido de investigação contra o juiz que inocentou um empresário ao aceitar a tese de “estupro culposo”, um crime não previsto em lei, para um abuso sexual supostamente praticado sem intenção. A decisão polêmica partiu do juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, responsável pelo caso.

Na audiência de instrução e julgamento do processo, o magistrado não interveio quando o advogado do acusado de estupro afirmou que a jovem, possível vítima, tinha como “ganha pão” a “desgraça dos outros”, nem quando foram mostradas fotos sensuais da garota, sem qualquer relação com o fato apurado, para questionar a acusação. As informações foram divulgadas pelo jornal O Estado de S.Paulo.

O pedido de investigação contra o juiz partiu do conselheiro do CNJ Henrique Ávila e é direcionado à corregedoria do órgão. Ávila quer que sejam averiguadas responsabilidades do magistrado na condução da audiência por meio da abertura de uma reclamação disciplinar. A proposta deve ser apreciada pelo plenário do Conselho.

“É chocante. Precisamos avaliar aprofundadamente para apurar responsabilidades”, disse Ávila ao Estadão. No pedido, o conselheiro descreve o que considera ter sido “uma sessão de tortura psicológica no curso de uma solenidade processual”.

O processo é de 2018. O estupro, conforme relato da vítima, Mariana Ferrer, ocorreu em 15 de dezembro daquele ano em uma badalada festa em Jurerê Internacional, Florianópolis. O empresário André de Camargo Aranha era o acusado. Na primeira instância, a Justiça o inocentou. O caso voltou à tona nesta terça-feira após o site The Intercept Brasil trazer imagens inéditas da audiência de julgamento.

Na gravação, o advogado de Aranha, Cláudio Gastão da Rosa Filho, dispara uma série de acusações contra Mariana, que vai às lágrimas e implora ao juiz que preside a audiência: “Excelentíssimo, eu estou implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada. Pelo amor de Deus, gente. O que é isso?” As imagens da audiência provocaram reações no meio jurídico.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes afirmou que as cenas “são estarrecedoras”. “O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, escreveu, em redes sociais, nesta terça.

O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas também repudiou a maneira como Rudson Marcos conduziu a audiência de julgamento. “Especialistas em Direito Penal certamente falarão com propriedade sobre a tese do estupro culposo, que confesso desconhecer. O vídeo é aviltante e dá impressão de que não havia juiz presidindo a audiência ou Promotor fiscalizando a lei. Havia?”, escreveu ele.