Jornal aciona STF para certificar que Bolsonaro entregou exames de Covid-19

Estadão também entrou com recurso no STJ contra a decisão do presidente do tribunal

Foto: Ricardo Giusti/CP

O jornal O Estado de S.Paulo entrou nesta sexta-feira com um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para certificar que o presidente Jair Bolsonaro entregou mesmo à Justiça todos os exames realizados para identificar se contraiu ou não o novo coronavírus. A Justiça Federal de São Paulo e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) haviam garantido o direito de a publicação ter acesso aos laudos por conta do interesse público em torno da saúde do chefe do Executivo. O governo, no entanto, conseguiu barrar a divulgação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o que levou o jornal a entrar com uma ação no STF.

Antes mesmo de o ministro Ricardo Lewandowski decidir sobre o caso, a defesa do presidente Jair Bolsonaro encaminhou ao Supremo três laudos – com codinomes –, todos informando resultado negativo. Em um deles, da Fiocruz, não há CPF, RG, data de aniversário nem qualquer outra informação que vincule o documento ao presidente da República. Para o Estadão, a entrega espontânea de documentos atribuídos a Bolsonaro não encerra o caso.

“Logo, impossível saber de antemão se realmente foram entregues todos os laudos de exame a que submetido o sr. Presidente da República, voltados a constatar tenha ou não Sua Excelência contraído a Covid-19 — e até mesmo se de fato a si aludem, já que utilizados pseudônimos e, no último deles, dado algum há que minimamente indique quem é o paciente”, ressalta o advogado do Estadão Afranio Affonso Ferreira Neto.

A Fiocruz informou ao jornal que emitiu um laudo de Covid-19 atribuído a Bolsonaro considerando uma solicitação “advinda do gabinete da Presidência da República”. A defesa de Bolsonaro sustenta que ele usou codinomes para evitar a identificação do paciente.

Uma resolução da Anvisa exige que o laboratório clínico e o posto de coleta laboratorial solicitem ao paciente um documento que comprove a identificação. No papel da Fiocruz, no entanto, o laudo é atribuído genericamente ao “paciente 5”, sem nenhuma informação adicional do sujeito.

“O que pode se dizer é que, pelo documento sozinho, não há garantia que o laudo é ou não é do presidente”, avaliou o professor de proteção de dados pessoais Alexandre Pacheco da Silva, da FGV Direito São Paulo.

Silva menciona ainda que a vinculação do laudo do “paciente 5” a Bolsonaro é feita em um outro papel, um ofício assinado pelo coordenador de Saúde da Presidência, o urologista Guilherme Guimarães Wimmer. “O que é complicado é que neste caso a gente espera receber essa informação do laboratório, que é um terceiro não interessado, e não do próprio governo”, disse o especialista da FGV.

Antecipação

O Estadão também entrou com recurso no STJ contra a decisão do presidente do tribunal, João Otávio de Noronha, que liberou Bolsonaro de entrega os exames. A defesa do jornal sustenta que, antes de decidir a favor do presidente, Noronha antecipou o entendimento sobre o tema ao dar uma entrevista ao site jurídico JOTA, o que contraria a Lei Orgânica da Magistratura Nacional.

Na entrevista, o presidente do STJ afirmou que “não é republicano” exigir que os documentos de Bolsonaro venham a público. “Não é porque o cidadão se elege presidente ou e ministro que não tenha direito a um mínimo de privacidade. A gente não perde a qualidade de ser humano por exercer um cargo de relevância na República”, argumentou.