Bolsonaro deve vetar socorro a estados e municípios, antecipa líder do governo

Equipe econômica é contra a proposta de atrelar o repasse à compensação pela queda do ICMS e do ISS em relação à base de arrecadação de 2019

Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados / Divulgação

O líder do governo na Câmara, deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), antecipou, na noite de hoje, que o presidente Jair Bolsonaro deve vetar o projeto de socorro aos estados e municípios, prejudicados pela crise decorrente da pandemia de coronavírus. “O governo vai atuar no Senado para modificar, e isso é do jogo democrático. Existe a possibilidade concreta de o presidente avaliar a possibilidade de um veto e essa discussão vai acontecer ainda para que a gente consiga desenvolver uma solução”, afirmou Vitor Hugo durante a sessão virtual que aprovou o texto. As informações foram divulgadas pelo jornal O Estado de S.Paulo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, insiste que o valor a ser repassado aos estados e municípios para ações de combate à Covid-19 seja definido por meio de um valor fixo. Guedes avisou que pode garantir até R$ 40 bilhões. Na noite de hoje, porém, a Câmara aprovou um texto que pode custar ao menos R$ 80 bilhões, apenas em compensação de perdas de receita em função da pandemia.

A estimativa de impacto é do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O projeto estabelece que a ajuda seja depositada entre maio e outubro. Os valores se referem à queda, entre abril e setembro, da arrecadação de impostos como o ICMS, que é estadual, e o ISS, que é municipal.

Foram 431 votos a favor e 70 contra. A medida ainda deve ser analisada pelo Senado.

Entenda 

O auxílio financeiro corresponde à diferença nominal, se negativa, entre a arrecadação verificada em 2020 e o patamar atingido com os mesmos impostos, nos mesmos meses, em 2019. De acordo com Maia, o cálculo de R$ 80 bilhões leva em conta uma queda de 30% no acumulado geral.

“Seis meses é um bom prazo”, disse Maia, antes da aprovação. Segundo ele, esse período é condizente com as previsões de especialistas para o ápice da crise da Covid-19. A ideia, disse o presidente da Câmara, é criar um “seguro” que dê “condições mínimas” para estados e municípios continuarem prestando serviços à população.

No total, o projeto de socorro deve ter impacto ainda maior. Além da recomposição da perda dos impostos, o texto também suspende cerca de R$ 9 bilhões em dívidas com BNDES e Caixa. O governo federal defendia, em vez de aumentar a compensação pela perda de receita, abrir espaço de R$ 55 bilhões decorrente de operações de crédito (empréstimos), mas os deputados entenderam, em maioria, que o momento é inoportuno para que prefeitos e governadores tomem novos empréstimos, sem garantia de que vão conseguir pagar.

Por que o governo é contra

A equipe econômica é contra a proposta de atrelar o repasse à compensação pela queda do ICMS e do ISS em relação à base de 2019 porque teme que a vinculação se transforme, no futuro, em uma nova Lei Kandir, que desonerou o ICMS das exportações e que é alvo até hoje de disputa na Justiça pela compensação aos estados exportadores pela perda de arrecadação.

“Fazer distribuição com base no ICMS vai reforçar que essas ações, que não são ações equilibradas e, a despeito de parecer ter um apelo sanitário podem, depois, dificultar demais a retomada do crescimento econômico. Então, essa é a principal preocupação do governo com esse texto”, disse Vitor Hugo durante a votação virtual do projeto.

Isolamento e perda de receita

Uma fonte da equipe econômica disse, ainda, que o governo não vai ter controle de repasse se estados maiores, como Rio, São Paulo e Minas Gerais prolongarem o isolamento. Nesse cenário, se os governadores João Doria (São Paulo) e Wilson Witzel (Rio de Janeiro) fizerem um isolamento longo, a perda na arrecadação para os cofres estaduais e municipais tende a ser muito grande, e o governo não quer bancar essa conta.

“Não pode ter relação com ICMS porque quem manda em ICMS é cada governador. E se o governador resolver fechar a casa por oito meses?”, afirmou ao Estadão uma fonte da equipe econômica. “O governador não pode achar que qualquer que seja a decisão dele o governo federal é responsável pelas consequências”, completou a fonte.

Sem contrapartida 

O texto ficou sem contrapartida aos estados e municípios, ao contrário do que defendia o Ministério da Economia. O governo queria vincular a medida a uma obrigação de prefeitos e governadores congelarem o aumento de salário dos servidores por dois anos, mas a exigência não entrou na proposta aprovada.

Maia disse que o congelamento de salário de servidores vai ser tratado pela Casa caso o governo envie um projeto sobre o tema ao Congresso.

“Precisamos ter clareza de que o presidente da República vai assinar. Qualquer tema que trate de salário precisa ser algo compactuado, não pode ter barriga de aluguel. Eu disse ao ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) que se o governo encaminhar a proposta, seja para os municipais e estaduais, inclusive para os federais, estamos dispostos a enfrentar esse tema (congelamento de salários)”, concluiu.