Municípios serão “chamados à responsabilidade” por adultos atendidos pela FPE

Alerta é do secretário de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do RS, Catarina Paladini. Discussão sobre o encaminhamento de pacientes para clínicas terceirizadas vem dividindo opiniões

Foto: Divulgação/AL

A Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos afirmou hoje que o município de Porto Alegre está sendo chamado à responsabilidade para com os adultos em situação de acolhimento em saúde mental. O titular da Pasta, Catarina Paladini, garantiu que grande parte dos adultos atendidos pela Fundação de Proteção Especial do Estado do RS (FPE) é porto-alegrense, e a legislação prevê que os maiores de idade sejam de responsabilidade de cada cidade. “O foco da FPE devem ser as crianças e os adolescentes, nós precisamos focar nesse público, e o município já está sendo acionado”, garantiu. O impasse pautou um debate no programa Esfera Pública, da Rádio Guaíba, na tarde desta quarta-feira.

Uma decisão judicial que determina a criação de 120 vagas imediatas para crianças e adolescentes inseridos no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAM) e também para adolescentes que saem da Fase motivou a mudança. Como os adultos, pela lei, devem ser suportados pelos municípios, as vagas e os investimentos do Estado serão revertidos para atender à determinação da Justiça, que se refere a crianças e jovens menores de idade.

O debate ressurge após críticas ao tratamento destinado aos adultos até então acolhidos pela FPE e hoje internados na clínica Liberdad. A Secretaria de Justiça assinou um contrato de seis meses com a empresa para dar suporte a esses pacientes, e alguns setores da saúde e da assistência social vêm criticando o modus operandi da casa. “Os adultos saíram da FPE e passaram a ser responsabilidade da Secretaria, o que nos permitiu celebrar parcerias com outras instituições”, explicou o secretário. A expectativa é de que os municípios encontrem alternativas para esse público durante a vigência do contrato com a Liberdad.

Para Jucemar da Silva Beltrame, advogada que representa a Frente Gaúcha em Defesa do SUAS e da Seguridade Social/RS, os pacientes foram “despejados” na clínica: “essas pessoas que estão acolhidas foram para a FPE ainda crianças. O Estado tem responsabilidade sobre essas pessoas, elas foram despejadas das casas onde vivem há 17 anos sem preparo, sem diálogo, sem avaliação técnica”, denunciou. Os trabalhadores que acompanharam a transferência dizem que os pacientes vêm sendo contidos com medicação, e que o vínculo com os profissionais antigos foi cortado abruptamente, fazendo o tratamento retroceder.

“É injusto e cruel o que estão fazendo com essas pessoas. Não foi construído debate por nenhum conselho profissional, não houve diálogo, e isso necessariamente tem que passar pelo conselho da assistência social”, disse Jucemar. Já Paladini garante que “está muito melhor do que era”. “A condição dos acolhidos é infinitamente superior no local de hoje do que era antes”, assegura.

O secretário admite que “não é o perfeito, não é o ideal, mas era o que se podia fazer”, no comparativo com o abrigo José Leandro de Souza Leite, onde eram atendidos anteriormente. O próprio secretário admite que esse abrigo pode “ser, sim, chamado de manicômio”, pelas condições precárias de estrutura e atendimento.

No fim de outubro, o Conselho Regional de Psicologia do RS (CRPRS) classificou a internação na clínica Liberdad como “violação de direitos de Pessoas com Deficiência”. O Conselho garante que realizou visita técnica nas instalações do local e evidenciou “a ausência de um projeto técnico qualificado que sustente as intervenções para atender as necessidades de sujeitos com graves transtornos de desenvolvimento”.

A nota ainda ressalta que os internos podem ser “acometidos de um sofrimento psíquico mobilizado pela brusca ruptura com seu ambiente e rotina”. O texto pondera, também, que o serviço oferecido pela Liberdad se configura como internação psiquiátrica no modelo manicomial, amplamente rechaçado no meio psiquiátrico. O conselho recomenda o modelo de moradia e acolhimento, com equipamentos comunitários de Saúde, Assistências Social e Educação.

Hoje, a FPE atende a 139 crianças e adolescentes e 84 adultos – um total de 232 pessoas. Até agora, foram preenchidas 104 das 120 vagas contratadas na clínica Liberdad. O contrato, assinado em 2 de outubro, vale por seis meses, até até 2 de abril de 2020. O valor da contratação emergencial é de R$ 13.950 mensais por paciente, gerando custo total de R$ 8,7 milhões no período total. Na FPE, conforme o governo, o custo mensal de cada interno gira na casa dos R$ 22 mil.