“É uma ilusão achar que armar a população vai diminuir crimes”, diz subchefe da Polícia Civil no RS

Decreto Presidencial alterou a regulamentação do Estatuto do Desarmamento

Foto: Álvaro Grohmann / CP

Em meio à polêmica envolvendo o decreto do presidente Jair Bolsonaro que flexibiliza a posse de armas no país, órgãos diretamente ligados à segurança temem pelas consequências de mais armas nas ruas. O subchefe da Polícia Civil gaúcha, delegado Fabio Motta Lopes, afirmou na manhã de hoje que “é uma ilusão achar que armando a população a gente vai diminuir os índices de violência e criminalidade”. Ele falou ao programa Direto ao Ponto, da Rádio Guaíba, ressaltando que não é contrário a todos os pontos da medida, mas que vê com preocupação a ampliação da posse.

Lopes explicou seu ponto de vista: conforme ele, criminosos costumam agir em maior número e com armas de grosso calibre, tendo o fator-surpresa a seu lado. “Armas de fogo tem de estar na mão de policiais. O portador vai ser surpreendido pelo assaltante, vai perder a arma e ela vai pra rua, vai pro crime”, continuou. Também mostrou preocupação quanto à ampliação do calibre permitido para a posse, que agora inclui pistolas 9 mm e o revólver .40, equipamentos antes restritos às forças de segurança.

O subchefe da PC no Estado também mencionou preocupação quanto aos critérios para autorizar a posse às novas categorias incluídas no decreto. Lopes ainda apontou um exemplo vindo dos EUA, em que estudos de universidades locais alertaram para o risco de aumento da violência em situações banais. Sobre eventuais treinamentos, aos quais profissionais da segurança pública são submetidos, disse não acreditar que o brasileiro “adquira o hábito de participar de capacitações constantes”.

O delegado falou ainda sobre o Estatuto do Desarmamento, de 2003. Ele concorda que o texto foi bastante rigoroso, e que antes disso havia uma flexibilidade muito grande para adquirir armamentos. Na mesma linha de raciocínio, relembrou que igualmente grande era o número de armas levadas em assaltos, que acabavam parando na mão de criminosos. “Não que sejam só elas, pois há grande número de armamento pesado que entra no país de forma ilegal, mas a maior circulação de armas também aumenta o índice de armas roubadas”, apontou.

Questionado sobre um eventual aumento no nível de brutalidade dos crimes, disse que é uma possibilidade a ser considerada: “os criminosos acabam matando por um simples gesto, por acharem que é uma reação. Agora imagina na cabeça do criminoso, se ele tem essa informação, de que a vítima pode ter uma arma? Eu não tenho dúvidas de que vai ampliar o número de crimes com armas de fogo”, asseverou. Por fim, disse que “por mais preparada que seja a vítima, às vezes ela não tem nem tempo de reação”, e que armas de fogo devem permanecer nas mãos de profissionais treinados.

Entenda o decreto

O Decreto Presidencial nº 9.785/2019 altera a regulamentação do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2016). A medida muda regras sobre aquisição, cadastro, registro, posse, porte e comercialização de armas de fogo.

Entre as novidades, o decreto amplia a diversidade de calibres de armas de uso permitido, incluindo semiautomáticas; aumenta a quantidade de compra de munições para armas de uso permitido (5 mil unidades por ano) e para armas de uso restrito (1 mil unidades por ano).

A nova norma estende a onze categorias o direito de porte de armas. Foram contemplados, entre outros, instrutores de tiros, colecionadores e caçadores; detentores de mandatos eletivos (Executivo e Legislativo), advogados e jornalistas que façam cobertura de pautas policiais.