Renato Janine Ribeiro, professor de Filosofia da USP e ex-ministro da Educação no segundo governo Dilma, afirmou na manhã desta quinta-feira (02) que o corte nas verbas de universidades públicas anunciado pelo governo federal tem “fundo ideológico”. A fala é decorrente de ação do governo Jair Bolsonaro, que anunciou nesta semana o corte de 30% nas verbas das universidades públicas de todo o país. “O atual presidente, em campanha, apontou a educação como uma ameaça à moral pública. Nós teríamos um déficit de moral porque a educação teria difundido valores imorais”, criticou.
O docente falou ao programa Direto ao Ponto, da Rádio Guaíba, e apontou que inicialmente o foco da ação havia sido direcionado para três instituições (UNB, UFBA e UFF), mas que “como é completamente ilegal cortar verbas por questões ideológicas, voltou atrás quando viu que isso é ilegal e se estendeu isso para 63 universidades.”
Reforçou que há, sim, um déficit nas verbas destinadas à educação nos últimos anos, mas que a decisão atual não foi baseada em questões econômicas: “o governo atual tem uma posição político-partidária que o coloca contra praticamente toda área da educação. Desde Itamar Franco, todos os governos, qualquer partido que fosse, entenderam que a educação era a chave para a emancipação, para melhorar de vida. O atual presidente, em campanha, apontou a educação uma ameaça, como uma ameaça à moral pública”, ressaltou.
Ribeiro afirmou ainda que essa situação é “muito grave, pois o corte do governo refletiria nas contas básicas das instituições, nas bolsas dos alunos, salários de professores, o que inviabilizaria a continuidade das atividades.” Sobre eventuais alternativas que os próprios estudantes poderiam tomar para manter bolsas e benefícios legais, citou o uso de instrumentos como ações na Justiça e liminares: “o estudante sem verba não come, não pega ônibus, não consegue chegar até a aula”, ponderou.
Ainda sobre o trato da atual gestão com o setor, disse que “é um governo que assume com muita desconfiança”. Apontou que a chamada “direita tradicional” não teria essa mesmo posição, visto que entenderia a necessidade do investimento em educação para a garantia e fortalecimento do crescimento econômico. Sobre as comparações com os investimentos de outros países, explicou que não seria correto comparar os investimentos do Brasil e da Alemanha (ambos na casa dos 6% do orçamento), por exemplo, quando o PIB do país europeu é cinco vezes maior que o brasileiro. “Isso faz com que o investimento deles seja cinco vezes maior, e na Alemanha está tudo pronto, você tem professores bem formados, bons laboratórios, não tem escolas sem banheiro”, disse.
Por fim, comentou acerca da falta de interesse na carreira do magistério. Apontou a defasagem salarial como um dos fatores que afastam o interesse dos jovens, e elencou o desprestígio pela qual a docência passa: “os professores dos anos 50 eram respeitados na cidade. Estavam no nível do juiz, do vigário, do promotor. E hoje o prestígio diminuiu. Se você perguntar numa sala de aula, poucos alunos dirão que querem ser professores. E veja que terrível: você passa doze anos em sala de aula e não vê um modelo de futuro para você”, encerrou.