A menos de 24 horas da votação em primeiro turno da proposta de emenda à Constituição (PEC) que prevê o fim da exigência de plebiscito para a privatização da CEEE, da Sulgás e da Companhia Riograndense de Mineração (CRM), quadros técnicos do Grupo CEEE deflagraram uma ofensiva sobre os deputados estaduais, apresentando dados que rebatem os expostos pelo Executivo na defesa da venda da companhia. Parlamentares de todos os partidos estão recebendo, nesta segunda-feira, um documento de 36 páginas assinado pela Comissão de Empregados do Grupo CEEE (composto pela CEEE-GT, CEEE-D e CEEE-Par). Nele, os funcionários abrem números, contestando informações sobre o déficit, e afirmando que a dívida de ICMS da companhia decorre de decisão de governo tomada no segundo semestre de 2017, quando a direção da empresa optou por deixar de pagar as parcelas mensais referentes ao repasse do imposto. Mas o destaque vai para as obrigações com os ex-autárquicos e a dívida com a Fundação CEEE de Seguridade Social (Eletroceee), dois pontos com potencial para também acabar em disputa judicial.
Conforme o relatório, o Grupo CEEE soma 3.342 empregados ativos (2.271 na CEEE-D e 1.071 na CEEE-GT), admitidos por concurso público pelo regime CLT. Mas, além deles, responde pelo pagamento de uma folha adicional de 943 ex-autárquicos, 79 pensionistas e diretores. O custo mensal da folha de pagamentos desses três segmentos, segundo o material divulgado pelos funcionários, é de R$ 11 milhões (R$ 144,4 milhões/ano), e não vai se extinguir com a privatização, sendo incorporada à folha de pagamento do funcionalismo estadual. Os ex-autárquicos fazem parte do chamado passivo trabalhista da companhia. O passivo é um dos principais contrapontos à argumentação da necessidade de privatização, porque as alternativas ventiladas até o momento para equacioná-lo não são vantajosas para o Estado: ou ele assume a conta ou concede um deságio significativo no valor de venda.
Para além dos ex-autárquicos, a outra questão a projetar sombra sobre o processo de privatização são os compromissos pactuados pelo grupo com a Fundação CEEE, uma fundação privada de previdência complementar, que configura hoje o maior fundo de pensão do Rio Grande do Sul. Além da CEEE-D e da CEEE-GT, ela administra planos previdenciários, na modalidade instituidor, de uma série de entidades. Totaliza 16 mil participantes, paga complementação de aposentadorias e pensões a 9,2 mil beneficiários e, anualmente, transfere cerca de R$ 621 milhões em benefícios. A Eletroceee é hoje, conforme os dados da própria fundação, o maior credor do Grupo CEEE, cujas obrigações atingiam, em dezembro passado, R$ 1,5 bilhão. E, conforme os termos vigentes, essas obrigações estão aptas a serem executadas à vista em caso de inadimplemento das parcelas mensais, redução de garantias ou, ainda, alienação de ativos da companhia.
No final de janeiro, a fundação notificou o governador Eduardo Leite (PSDB), alertando sobre o ordenamento jurídico das responsabilidades pactuadas entre o grupo e a Eletroceee. Em quatro páginas, a correspondência salienta o fato de ser a maior credora, adverte que vai tomar as providências legais cabíveis em caso de medidas unilaterais que tentem ou possam vir a diminuir as garantias atuais para execução dos créditos e assinala que a CEEE-D, a CEEE-GT e o governo ficarão “obrigados, em eventuais hipóteses de reorganização societária ou de transação, a integralizar o pagamento total da dívida e dos compromissos previdenciários até a data da efetiva transmissão ou transferência de direitos e obrigações ao novo controlador das empresas do Grupo CEEE.”
Já sobre o débito de ICMS da companhia (R$ 1,2 bilhão), os funcionários dizem que uma opção era ter buscado a captação de recursos junto a instituições financeiras como o BNDES, a exemplo de outra distribuidora de energia que atua no RS, controlada pela estatal chinesa State Grid, que captou junto ao banco R$ 1,1 bilhão, no ano passado.
O documento lista, ainda, oito categorias de devedores da CEEE que, somadas, atingem R$ 427 milhões em débitos, dos quais R$ 112 milhões referentes à iluminação pública. O documento lembra, por fim, que o grupo detém um patrimônio estimado de R$ 8,8 bilhões e não gera ônus para o Estado, por possuir receita própria.