TRF4 condena comerciante gaúcho a pagar quase R$ 8 milhões por desviar arroz estocado

BRS Esmeralda

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) condenou um comerciante e sócio-gerente da empresa Granja Retiro Agropecuária, residente de Pelotas (RS), a pagar R$ 7.951.872 para ressarcir dano causado ao erário público. Jairton Kruger Russo foi considerado responsável pelo desvio, na década de 1990, de 3 milhões de quilos de arroz em casca de propriedade da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que estavam sob depósito nos armazéns da sua empresa.

A decisão unânime da 3ª Turma, proferida dia 25 de fevereiro, reafirma a tese de imprescritibilidade de ações de ressarcimento ao erário decorrentes de ato de improbidade e de ilícito criminal. Além disso, reforça que o Ministério Público Federal (MPF) é parte legítima para ajuizar ações civis públicas em defesa do patrimônio público.

O caso em detalhes – O MPF ajuizou, em janeiro de 2016, uma ação civil pública contra Russo. O valor integral da indenização pedida foi de R$ 7.951.872,00, montante atualizado até a data do ajuizamento da ação.

No processo, foi narrado que a Conab firmou contrato de depósito com o réu em junho de 1992. A finalidade do contrato seria a guarda e a conservação por parte da Granja Retiro Agropecuária de produtos destinados às políticas agrícolas e de abastecimento fomentadas pelo governo federal.

Dentre os depósitos realizados nos armazéns da empresa, em agosto de 1995, foram entregues 5 milhões e 377 mil quilos de arroz em casca, referentes à safra de 1991/1992. No entanto, segundo o MPF, em uma ação de vistoria da Conab, em janeiro de 1996, foi constatado o desvio das 3 mil toneladas.

Questionada pela Coordenadoria de Cobrança da Conab, a Granja Retiro Agropecuária, através do seu sócio-gerente, respondeu alegando não ter responsabilidade pelo extravio apurado, pois teria cedido em comodato os seus armazéns a outra empresa denominada Agrocomercial e Industrial Bela Vista no período de tempo em questão.

O MPF recorreu ao Judiciário, sustentando ser inequívoca a responsabilidade do réu no caso. Apontou que, além do contrato firmado entre Russo e a Conab, os recibos de depósitos e os comprovantes de pagamento de despesas de armazenagem e sobretaxa confirmam que foi confiada à empresa dele a guarda dos grãos desviados.

O juízo da 1ª Vara Federal de Pelotas, em julho de 2016, julgou improcedente o pedido, extinguindo o processo. Foi considerado que, no caso, a ação civil pública é uma via processual imprópria e que o MPF é ilegítimo para atuar como parte, além disso, o juízo também decretou a prescrição da pretensão de ressarcimento ao erário.

O MPF recorreu ao TRF4, pleiteando a procedência da ação e a reforma da sentença. A 3ª Turma do tribunal decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, condenando o réu a restituir ao erário a quantia requerida no processo.

Para a relatora do recurso na corte, desembargadora federal Vânia Hack de Almeida, a ação civil pública é adequada, pois o interesse a ser defendido no processo é público. “Em que pese ser dotada de personalidade jurídica de direito privado, o que gera uma igualdade de direitos e obrigações em relação às empresas privadas de forma a proteger o princípio da livre concorrência, a Conab é uma empresa pública caracterizada por possuir gestão pública, objeto público, capital social proveniente de verbas públicas e patrimônio, indubitavelmente, público”, reforçou.

Quanto à legitimidade do MPF para atuar como parte nesse processo, a magistrada destacou que “o Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública visando à reparação de danos causados ao patrimônio público e social, tal qual previsto no artigo 1°, inciso VIII, da Lei n° 7.347/19885, bem como corroborado pelo Superior Tribunal de Justiça em sua Súmula n° 329 e precedentes”.

Vânia também acolheu o argumento do MPF de que não se pode deixar “impune lesão de dimensões exorbitantes ao erário Federal” em função de “suscetibilidades jurídicas acerca de requisitos formais que em nada prejudicaram o regular andamento do processo”.

Segundo a desembargadora, deve ser julgado procedente o pedido, “com a condenação do requerido a restituir ao erário público a quantia indicada na inicial”. E, na fase de execução do processo, deve ser decidida a forma de cálculo dos juros e da correção monetária do valor, bem como estabelecida a medida cautelar de indisponibilidade de bens do condenado.