Mais uma reviravolta no caso das crianças esquartejadas em Novo Hamburgo: a Corregedoria da Polícia Civil pediu, nesta sexta-feira, o indiciamento do delegado Moacir Fermino e de outras duas pessoas – uma testemunha e um agente policial – envolvidas na investigação sobre a morte de duas crianças esquartejadas, encontradas em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos. Na casa do delegado, a Polícia Civil apreendeu, com vários trechos sublinhados, um livro intitulado. “Ele veio para libertar os cativos”. Além disso, uma troca de mensagens de celular entre o delegado e o suposto profeta embasa o indiciamento.
Conforme o delegado e corregedor Antônio Lapis, o caso é de extrema complexidade e, por vezes, ficou difícil até para a Polícia entender as motivações e o envolvimento das testemunhas e do delegado Fermino no caso. “A gente tentou trabalhar com a linha cronológica, mostrando para todos como funcionou e o que exatamente aconteceu. O Paulo (nome fictício de outro indiciado, que a Polícia não identifica), uma das testemunhas que era chamada de ‘profeta’ pelo delegado Fermino, criou uma história e convenceu outras pessoas a prestarem depoimento e se envolverem no caso, garantindo a elas uma proteção”, comenta Lapis.
Além disso, o corregedor explica que Paulo e Fermino mantinham uma relação política há algum tempo (a testemunha havia sido cabo eleitoral de uma campanha do delegado, em uma eleição para vereador). Lapis presume que, como ambos se conheciam. há anos, o delegado acreditou nas informações repassadas pelo “profeta”. “Paulo chegou até o Fermino, eles levantaram alguns possíveis nomes que poderiam ter envolvimento dentro dessa história que ele criou, dentro da questão de ritual satânico e, a partir disso, o Fermino começou a ‘desenhar’ a caminhada do inquérito até chegar à prisão dos supostos envolvidos. Até que o delegado insistiu no pedido de (mais) uma testemunha e que elas começassem a aparecer, pois seria necessário, já que o caso viria à tona na mídia”, esclarece.
Sobre o que pode ter motivado Fermino a fazer parte do esquema, Lapis disse que não pode afirmar com certeza, mas ponderou que possa ter relação com a igreja que ele frequenta e a vaidade do policial. “Ele frequenta uma igreja e, segundo o que recebemos de informação, isso poderia fazer ele ascender religiosamente e entendemos que essa seria uma das motivações. A elucidação de um crime cruel com revelações divinas poderia, sim, trazer a ele um auxilio dentro da igreja”, explica o delegado. Questionado sobre uma possível desavença entre Sílvio Rodrigues (a quem Fermino se referia como “bruxo”) e o delegado afastado, a Polícia Civil admite que não conseguiu comprovar.
Fermino foi indiciado pela Corregedoria por sete crimes. “Por três falsidades ideológicas e quatro (vezes) por corrupção de testemunha”, salienta Lapis.
Fermino assumiu a fase inicial da investigação quando, em janeiro, disse ter recebido uma revelação divina, de um profeta de Deus acerca dos suspeitos. Ele concluiu, então, que as crianças haviam sido mortas em um templo que fica no bairro Morungava, em Gravataí. Disse, na ocasião, ainda que durante o ritual, que os participantes tomaram sangue das crianças – um menino, entre 8 e 10 anos, e uma menina, entre 10 e 12 – que ainda não foram identificados, apesar de se saber que são irmãs por parte de mãe. As cabeças delas não foram localizadas até o momento.
Depois disso, o delegado titular – Rogério Baggio – reassumiu o caso, e em uma reviravolta, mandou soltar todos os presos, então suspeitos pelo crime. Descobriu-se que as testemunhas mentiram sobre o suposto bruxo e ritual. Fermino acabou afastado das investigações em fevereiro e a Corregedoria assumiu a investigação sobre a conduta do delegado.