O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, falou nesta quinta-feira, à CPI da Covid, no Senado. Por cerca de seis horas, ele abordou diferentes questões sobre a pandemia, contradisse afirmações do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e relatou que ações e falas do presidente Jair Bolsonaro afetaram as negociações para a compra da CoronaVac pelo governo e o envio de matéria-prima pela China.
Covas apontou a falta de uma coordenação nacional para medidas não farmacológicas, como o uso de máscaras ou a prática do isolamento social, como um dos motivos para o avanço da pandemia.
O diretor também previu a possibilidade de um recrudescimento da doença nas próximas semanas, a necessidade de reforços anuais na vacinação e a estimativa de entrega de 40 milhões de doses da vacina ButanVac, desenvolvida integralmente pelo instituto, ainda em 2021.
CoronaVac
Covas avaliou que o Brasil perdeu a chance de ter sido o primeiro país do mundo a iniciar a vacinação. Ele relatou que, em julho, o Instituto Butantan enviou ao Ministério da Saúde uma sugestão de contrato para a entrega de 60 milhões de doses até dezembro do ano passado. A oferta não teve resposta, segundo o diretor do Butantan.
À época, a vacina ainda não tinha o uso aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o que só ocorreu em janeiro. No entanto, as intenções de compra já eram negociadas com o Butantan e outros laboratórios, como a Pfizer e a AstraZeneca – sendo essa última a primeira a única a ter contrato fechado com o governo brasileiro naquele momento.
As negociações para a compra da CoronaVac pelo governo federal para distribuição para todo o país foram retomadas posteriormente, e, em outubro, o instituto ofertou 100 milhões de doses a serem entregues até maio. Segundo Covas, o governo oficializou a intenção de compra no dia 19 de outubro e, no dia 20, as negociações foram suspensas após o presidente Jair Bolsonaro vetar a compra da vacina chinesa. Ainda naquela oportunidade, o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse em vídeo publicado nas redes sociais: “um manda, outro obedece”.
“Infelizmente, essas conversações não prosseguiram, porque houve, sim, aí, uma manifestação do presidente da República, naquele momento”, afirmou Dimas à CPI.
As afirmações contradizem a fala de Pazuello à CPI, de que não houve ingerência para a não contratação da vacina do Butantan. O contrato acabou fechado apenas em janeiro de 2021, com uma dose menor que a prevista inicialmente – 46 milhões.
China
Covas afirmou ainda que as ações do governo e falas contra a China, como a afirmação do presidente em alusão à suposta guerra biológica promovida pelo país, comprometem o envio de matéria-prima para a produção de vacinas pelo Butantan.
“Temos cem vizinhos. Noventa e nove são cordiais, nos tratam bem, vão na nossa casa sempre com grande prazer, nos convidam para ir na casa deles. Um vizinho é o mal-comportado. Aquele que sempre tem uma observação a fazer. Na festa de fim de ano vamos chamar aquele vizinho ou os outros?”, afirmou.
A dificuldade para obter o IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo) levou a paralisações na produção da CoronaVac. Neste mês de maio, o instituto ficou sem produzir doses entre os dias 14 e esta quinta-feira, quando os trabalhos foram retomados após chegada de nova remessa.