O impacto das enchentes ainda afeta o cotidiano de empreendedores do setor de restaurantes no Centro Histórico de Porto Alegre, embora o movimento de consumidores nestes locais esteja rumo à normalidade de antes da tragédia. As marcas da água seguem sendo o retrato mais visível deste acontecimento, enquanto empresários da região buscam a retomada e novas soluções para se reerguerem.
Na avenida Siqueira Campos, o proprietário de um restaurante, José Augusto Rodrigues Gouveia, afirma que praticamente tudo foi perdido, porém já foi reconstruído. “As mercadorias, todas, foram para o lixo. Tínhamos três freezers com carnes. Os itens perecíveis também foram descartados. Só na parte de trás daqui, são 44 mesas e 88 cadeiras. Perdi, agora tive de comprar a maioria usada”, comenta ele. A clientela reduziu em 60% em relação ao que havia antes da tormenta.
Muitos colaboradores do local também foram afetados, e nem mesmo diante da tragédia, afirmou ele, compreenderam a situação e renegociaram os valores das aquisições dos alimentos. De fala tranquila, Gouveia diz agora celebrar o retorno dos clientes, mesmo que tímido por enquanto, enquanto ressalta que, ao menos o buffet na parte superior pôde ser salvo, enquanto o do andar térreo foi condenado pela água.
Mesma situação foi relatada por Gilmar Kuhn, gerente de outro negócio na rua General Câmara. “Foi um contexto muito complicado. Levantamos algumas coisas no começo, uns 40 centímetros de altura, só que a água chegou a 1,60 metro aqui dentro. Acabou praticamente destruindo todos os móveis do salão, o piso de gesso acartonado foi comprometido e sobraram somente os pés das mesas e cadeiras. Um cenário de guerra, uma cena muito triste”, contou ele.
Mas, em duas semanas, praticamente tudo estava de pé novamente. “Ninguém ficou na mão. A casa procurou manter toda a equipe, que também fez por merecer. Assim que pudemos entrar de novo, todo mundo começou a se abraçar, foi um momento bastante emocionante”, afirmou ele. O restaurante gerenciado por Kuhn pôs, inclusive, balões na entrada, como forma de convidar novamente os clientes a frequentar o espaço, o qual, na área interna, mais não demonstra nenhuma marca da cheia, além de instalar uma placa alusiva ao local onde a água atingiu.
Então presidente da seccional Rio Grande do Sul da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), João Melo, proprietário do Restaurante Gambrinus, tradicional do Mercado Público, afirma que o movimento no Centro Histórico ainda está aquém do desejado. “Isso porque o Trensurb não está chegando até a estação do Mercado Público. O aeroporto também contribui muito para a circulação mais baixa de pessoas. Esperamos que ambos voltem a funcionar minimamente”, comentou ele.
A atual presidente, Maria Fernanda Tartoni, reforça que o menor fluxo decorre de muitas pessoas ainda estarem em home office como regime de trabalho. “Aos poucos o Centro Histórico deve voltar a algo mais próximo da normalidade, mas por enquanto ainda o movimento é fraco. Não podemos esquecer do turismo: com o aeroporto inoperante, o movimento diminui. Temos dias de luta, mais uma vez, até voltarmos ao normal.”
Temor pelo contato com água contaminada
A Abrasel fez, também, uma cartilha relacionada a um certo temor de alimentação nestes locais por parte do público, devido ao contato destes prédios com as águas da enchente. Conforma a entidade, ela inclui cuidados essenciais que abrangem formas adequadas de higienização, processos para a devida manutenção de aspectos sanitários e a ordem de realização destes procedimentos. “Ela foi desenvolvida para assegurar que os estabelecimentos estejam preparados para enfrentar as condições após enchentes e alagamentos”, afirmou a especialista em segurança dos alimentos Adriana Lara, uma das autoras do conteúdo.
A Secretaria de Saúde de Porto Alegre, responsável pela Vigilância Sanitária, afirmou que não há uma recomendação específica para as pessoas em relação a restaurantes, especificamente. Porém, há uma portaria do órgão, datada do último mês de maio, informando, por exemplo, o dever de não comercializar ou utilizar para o consumo humano alimentos, embalagens de alimentos ou produtos em geral, devendo ele ser descartado. O documento está disponível publicamente.