O depoimento do pai do menino Rafael, Rodrigo Winques, foi marcado por um embate entre a testemunha e os advogados de defesa da ré em Planalto, no Norte do Rio Grande do Sul. O agricultor, que foi a quinta pessoa ouvida no júri que apura as responsabilidades de Alexandra Dougokenski na morte do próprio filho, chegou ao plenário vestindo uma camiseta com a foto da vítima.
Inicialmente, Rodrigo foi questionado sobre a relação que tinha com Rafael e com a ré. O homem sustentou que se dava bem com ambos, apesar dos conflitos que acarretaram no divórcio do casal, e que o filho tinha a intenção de viver com ele em Bento Gonçalves, na Serra. “Às vezes vinha para Planalto, pegava ele para tomar sorvete. Ele disse pra mim que quando fizesse 12 anos queria ir pra lá comigo”, relata.
Depois, logo que chegaram ao fim as perguntas dos promotores do Ministério Público, Rodrigo antecipou que não desejava responder aos questionamentos dos advogados de Alexandra. Após uma breve discussão, o depoente concordou em seguir com o testemunho – no qual foi questionado sobre a proximidade com Rafael e onde se encontrava na data em que o menino desapareceu, dez dias antes de ser encontrado morto.
“A última vez que eu vi ele foi no início da pandemia. Não fiquei muito (em Planalto). Só entreguei o dinheiro e fui embora”, recorda. Por fim, o pai da vítima foi confrontado sobre os conteúdos encontrados no celular dele, envolvendo armas de fogo e pornografia. Segundo ele, as fotos tiveram origem em grupos do qual fazia parte no WhatsApp, e não eram de autoria própria.
O depoimento terminou assim que Rodrigo foi questionado sobre a relação com o enteado Anderson, irmão mais velho de Rafael, que afirmou durante o depoimento, mais cedo, que havia sido abusado sexualmente pelo padrasto. Rodrigo negou os fatos e se retirou do plenário, onde os defensores da ré permaneceram sustentando que vão provar as suspeitas na fase de debates do júri.
A expectativa é de que Rodrigo retorne ao foro nos próximos dias – desta vez para ser colocado frente a frente com Alexandra, em uma acareação. Isso porque a mulher, que inicialmente confessou ter assassinado Rafael, hoje culpa o pai do garoto pela morte.
“Mãezona”
Com o fim do depoimento do pai da vítima, os trabalhos tiveram sequência com a fala da professora Ladjane Ravajo, que conviveu com Rafael no ano que antecedeu a morte do menino. A fala da educadora foi breve, restrita a questionamentos sobre a personalidade dele – descrito, mais uma vez, como educado e excessivamente tímido. Depois, foi a vez da avó materna do garoto, Isailde Batista, sentar perante o júri popular.
A mãe de Alexandra defendeu a filha e levantou suspeitas sobre o ex-genro. “Se não foi o pai que levou o guri dali, Deus me mate aqui”, declarou a testemunha. Logo depois, ela descreveu a ré como uma “mãezona”, incapaz de fazer mal aos filhos. “Dou minha vida como ela não matou. Ela não mata um bichinho”, disse. Isailde também optou por se retirar após um embate entre acusação e defesa.
“Está na hora de ela falar a verdade”
Mais cedo, durante a manhã, o depoimento foi do ex-namorado de Alexandra, Delair Pereira de Souza. Ele disse ter sido enganado pela ré. “Só ela vai poder falar a verdade. Acho que está mais do que na hora de ela falar a verdade. Por todo sofrimento que ela está causando para a família dela e para o Rafa descansar também”, afirmou. O homem se emocionou ao lembrar que foi investigado como suspeito da morte de Rafael.
Questionado pela defesa sobre a repercussão do caso, Souza afirmou que se mobilizou para tentar encontrar o garoto, mas Alexandra jamais acompanhou as buscas. “A cidade toda de Planalto se mobilizou”, recorda. Em vários momentos, o depoente interrompeu a fala e chorou. O depoimento de Souza durou uma hora e meia. Em seguida, foi a vez do irmão de Rafael, Anderson Vinicius Dougokenski.
Ao chegar à sala do júri, o jovem foi abraçado por Alexandra, que chorava. Ao responder os questionamentos dos promotores de justiça, o jovem relatou que foi vítima de abuso sexual por Rodrigo Winques, mas que não contou para a mãe. Após um intervalo, Anderson retomou o depoimento e disse que o pai de Rafael quebrava os celulares para impedir o filho de contatar a família.
O jovem relatou que após a separação de Alexandra e Rodrigo, Rafael não queria mais saber do pai. “Ele dizia que o Delair era um pai para ele”, afirmou. Em meio ao depoimento, o jovem se emocionou e chorou. “Minha mãe não teria coragem de matar o Rafael”, completou.
Relembre o caso
Rafael Mateus Winques desapareceu em 15 de maio de 2020. O menino teve o corpo encontrado dez dias depois, em uma caixa de papelão colocada no terreno da casa vizinha ao lado da que residia com a mãe e o irmão, no bairro Medianeira, em Planalto. A perícia indicou asfixia mecânica, provocada por estrangulamento, como causa da morte.
Conforme a denúncia do Ministério Público, Alexandra matou o filho por se sentir incomodada com as negativas dele em acatar ordens e diminuir o uso do celular e os jogos online. Ainda de acordo com a acusação, a ré deu ao menino comprimidos de Diazepam e, por volta das 2h, estrangulou a criança com uma corda.
A mulher responde pelos crimes de homicídio qualificado (motivo torpe, motivo fútil, asfixia, dissimulação e recurso que dificultou a defesa da vítima), ocultação de cadáver, falsidade ideológica, e fraude processual. Essa é a segunda tentativa de encerrar o caso, que começou em 15 de maio de 2020.