OMS: 500 milhões de pessoas terão doenças cardíacas e diabetes até 2030 devido ao sedentarismo

Organização Mundial da Saúde estima que governos gastarão, em uma década, mais de R$ 1,5 trilhão por impactos associados à falta de atividade física da população

Foto: Arquivo/ABr

Entre 2020 e 2030, se governos globais não adotarem medidas urgentes para incentivar a atividade física, cerca de 500 milhões de pessoas irão desenvolver doenças cardíacas, diabetes, obesidade ou outras DNTs (doenças não transmissíveis) em decorrência do sedentarismo.

Também chamada de inatividade física, a condição irá custar anualmente em torno de R$ 142 bilhões (US$ 27 bilhões) aos cofres dos 194 países analisados. O percentual equivale a mais de R$ 1,5 trilhão até 2030 (US$ 300 bilhões).

Os números foram publicados nesta terça-feira (18) no relatório inédito de status global sobre atividade física 2022, organizado pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Atualmente, o Ministério da Saúde estima que 22% da população brasileira está obesa. Um estudo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) também mostrou recentemente que três em cada dez adultos, no Brasil, devem sofrer de obesidade até 2030.

As doenças cardiovasculares, por sua vez, especialmente infarto e AVC (acidente vascular cerebral), já mataram, em 2022, mais de 300 mil brasileiros – uma média de 1.100 por dia, ou 46 por hora, segundo a SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia).

Os números demonstram a importância da atividade física, já que “é bom para a saúde pública e faz sentido econômico promover mais atividade física para todos”, disse Ruediger Krech, diretor do Departamento de Saúde, em comunicado divulgado pela OMS.

O relatório analisou os dados de 194 países e evidenciou que o progresso dos governos na implementação de recomendações para atividades físicas em todas as idades é lento e precisa ser acelerado, para elevar os níveis de prática de atividades físicas, prevenir doenças e reduzir a carga sobre os sistemas de saúde.

Apenas 30% desses países têm diretrizes nacionais de atividade física que contemplam todas as faixas etárias. Além disso, menos de 50% têm uma política nacional voltada ao assunto – e menos de 40% delas estão funcionando.

Quando o relatório avaliou o sistema de supervisão de atividade física, percebeu que menos de 30% dos países monitoram a prática entre crianças menores de cinco anos. Quase todos eles relatam ter esse sistema para adultos e 75% para adolescentes.

Levando-se em consideração as políticas que poderiam incentivar o transporte ativo e sustentável (efetivo no combate ao sedentarismo), como a caminhada e o ciclismo, apenas pouco mais de 40% dos países têm projetos de estradas que tornam a prática segura.

“Precisamos de mais países para ampliar a implementação de políticas para apoiar as pessoas a serem mais ativas por meio de caminhadas, ciclismo, esportes e outras atividades físicas. Os benefícios são enormes, não apenas para a saúde física e mental dos indivíduos, mas também para as sociedades, ambientes e economias” disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.

Ainda que as políticas nacionais para combater as DNTs e o sedentarismo tenham aumentado nos últimos anos, hoje, 28% delas não são financiadas ou não foram de fato implementadas.

Exercício aliado no controle de diabetes

A estudante Verônica Nunes, de 23 anos, recebeu o diagnóstico de diabetes tipo 1 em 2011. Desde criança, teve recomendações médicas para praticar atividades físicas.

“Quando eu tinha 12 anos, eu tinha que fazer caminhada. Depois que fiquei mais velha, eu comecei a ir à academia. Eu nunca fui uma pessoa que gosta de academia, mas eu precisava por conta do diabetes”, conta Verônica.

A estudante explica que a atividade física ajuda a controlar a glicemia e a insulina, e que pessoas com essa condição devem sempre acompanhar os níveis de glicemia e ter algum alimento na bolsa durante os exercícios (qualquer um que tenha açúcar ou que transforme o carboidrato rapidamente em açúcar), pois ela pode baixar.

“Na pandemia, eu comecei a não me cuidar direito, cheguei a ter 100 kg, e, ao invés de eu só ter a diabetes tipo 1, eu também estava começando a ter a tipo 2 junto. Ao invés de estar cuidando de uma diabetes, eu ia estar cuidando de duas. Então, é muito importante fazer atividade física, por mais simples que seja – uma caminhada, corrida, funcional, natação, qualquer tipo de exercício. Meus médicos pediam e tinha recomendação para eu fazer atividade física, era muito importante, além, obviamente, da alimentação”, relata Verônica.

A estudante relembra que, em determinada época, ela não precisava aplicar muita insulina no corpo – apenas em torno de duas canetas – graças ao exercício físico, que estimula a produção e ajuda no transporte da substância.

“A insulina deixa você com mais fome e também dá mais possibilidade de você engordar, e engordar prejudica o diabetes. Então, eu preciso da insulina, mas também não posso abusar dela. O jeito de eu conseguir, além de remédios, é a atividade física, uma fonte natural e excelente”, conclui.

Pandemia do novo coronavírus

Assim como Verônica, milhões de pessoas deixaram de praticar atividades físicas durante a pandemia de Covid-19.  No mesmo período, as campanhas nacionais de comunicação e os eventos voltados para a prática também foram paralisados. Nos últimos dois anos, apenas pouco mais de 50% dos países fizeram uma dessas iniciativas.

Essa situação também afetou a implementação de outras políticas e aumentou as desigualdades no acesso às práticas de atividade física em comunidades, por exemplo.

“Precisamos facilitar programas inclusivos de atividade física para todos e garantir que as pessoas tenham acesso mais fácil a eles. Este relatório emite um apelo claro a todos os países para uma ação mais forte e acelerada de todas as partes interessadas relevantes, trabalhando melhor em conjunto para atingir a meta global de uma redução de 15% na prevalência de inatividade física até 2030”, alerta a OMS.

O plano de ação global apresentado pela organização estabelece 20 recomendações de políticas para que os países atinjam a meta estipulada no relatório. Entre elas, estão: criação de estradas mais seguras para incentivar a caminhada e o ciclismo e o fornecimento de mais programas de atividade física em ambientes-chave, como creches, escolas e locais de trabalho.

O relatório conclui que muito mais precisa ser feito quando se trata da valorização da atividade física e o combate ao sedentarismo. Ainda há lacunas nos dados globais que impedem uma avaliação mais detalhada e dificultam o acompanhamento do progresso das ações políticas voltadas ao assunto, como a estipulação de prazos corretos para criação de espaços públicos abertos.

“Faltam indicadores aprovados globalmente para medir o acesso a parques, ciclovias, trilhas para pedestres – embora saibamos que existem dados em alguns países. Consequentemente, não podemos relatar ou rastrear o fornecimento global de infraestrutura que facilitará o aumento da atividade física”, disse Fiona Bull, chefe da Unidade de Atividade Física da OMS.

E alerta: “Pode ser um círculo vicioso, nenhum indicador e nenhum dado leva a nenhum rastreamento e nenhuma responsabilidade e, muitas vezes, a nenhuma política e nenhum investimento. O que é medido é feito, e temos um caminho a percorrer para rastrear de forma abrangente e robusta as ações nacionais sobre atividade física”.

Por fim, o documento pede que os países deem prioridade à atividade física como ponto-chave para melhorar a saúde e combater as DNTs. A prática deve ser integrada em todas as políticas de relevância e os países têm como missão desenvolver ferramentas, orientações e treinamentos para adequar a implementação dessas políticas.

*Estagiária do R7, sob supervisão de Fernando Mellis.