Um atentado inédito desde o retorno à democracia na Argentina, na noite dessa quinta-feira, do qual a vice-presidente Cristina Kirchner saiu ilesa, ainda deixa muitas interrogações sobre as circunstâncias do ataque e a personalidade do agressor.
Como aconteceu o atentado?
Imagens de vídeos mostraram que o agressor se aproxima a poucos centímetros da vice-presidente, aponta uma pistola contra ela e aciona o gatilho, mas o disparo falha. Nesse momento, Cristina cumprimentava centenas de seguidores que a esperavam diante da residência para manifestar apoio.
“Vi atrás do meu ombro esse braço com uma arma e, junto com outras pessoas que estavam ali, conseguimos controlá-lo”, contou à Agência France Presse (AFP) um dos simpatizantes de Cristina Kirchner que estava no local.
O advogado da vice-presidente, Gregorio Dalbón, disse “não ter nenhuma dúvida” de que a segurança dela falhou e acrescentou que ‘ainda não se sabe se foi uma pessoa solitária ou se há algo mais’. Segundo Dalbón, no momento do ataque, Cristina não percebeu o que tinha acontecido. “Ela percebe uma confusão, [mas] só se deu conta de que foi um arma quando chegou no apartamento. Ela não percebe a arma, por isso continua autografando livros”, contou.
A arma era uma pistola Bersa 380, apta para ser utilizada. Tinha cinco balas no carregador, mas não tinha um projétil no tambor. O agressor acionou o cão e o gatilho mas não houve disparo de projétil, segundo a perícia policial. Ainda não se sabe se os disparos não ocorreram porque o agressor ficou nervoso e não acionou corretamente o cão, ou se a arma é antiga e sem manutenção. Durante uma diligência policial na casa do atirador, nesta sexta-feira, foram encontradas 100 balas de calibre 9 mm.
Quem é o agressor?
Trata-se de Fernando André Sabag Montiel, de 35 anos, de nacionalidade brasileira e filho de um chileno e uma argentina. Viveu na Argentina desde a infância e esteve radicado por um tempo no Uruguai, de onde retornou a Buenos Aires em 2018. Em 2021, apesar de indiciado por porte ilegal de arma branca, uma faca de 35 cm de comprimento, ele teve o caso arquivado. Não tinha uma ocupação formal conhecida, mas, segundo um vizinho, trabalhava como motorista de aplicativo.
Pelas redes sociais, publicou diversas fotos com aspectos e estilos diferentes: cabelos longos e curtos, com ou sem barba, exibindo várias tatuagens, entre elas um sol negro, símbolo utilizado pelos nazistas. No Instagram, Fernando teve o perfil fechado na madrugada desta sexta.
O que a Justiça está investigando?
O caso está registrado como tentativa de homicídio qualificado. A juíza María Eugenia Capuchetti está a cargo da investigação junto do promotor Carlos Rívolo. Hoje, a juíza inspecionou o local do atentado e ouviu o depoimento de Cristina. No tribunal, ouviu os depoimentos de testemunhas, policiais e seguranças da vice-presidente. O suspeito foi detido e transferido ao tribunal para ser interrogado.
O advogado de Cristina disse que vai pedir à juíza para que a cliente seja incluída como parte querelante no caso que investiga a tentativa de homicídio. A vice-presidente ainda não se manifestou publicamente, mas na tarde desta sexta-feira saiu de casa pela primeira vez desde a tentativa de assassinato sofrida. Acompanhada por dezenas de seguranças e policiais, Kirchner acenou para simpatizantes que peregrinavam em frente à residência, na Recoleta.
Na segunda, devem começar as alegações da defesa no julgamento em que Cristina é acusada de fraude ao Estado e associação ilícita durante mandato no qual o Ministério Público solicitou uma pena de 12 anos de prisão e a inabilitação política da ex-presidente. Com um total de 13 acusados, estima-se que os advogados de defesa se pronunciarão no fim de setembro.