Formação de professores em EAD cresce no Brasil, aponta pesquisa

Docentes brasileiros recebem salários de 30% a 40% menores do que outros profissionais com curso superior equivalente

Foto: ASCOM / Divulgação / CP

A formação dos professores brasileiros, agregada ao atual contexto socioeconômico e político, tem alterado o perfil profissional. E o período pandêmico foi outro fator que resultou em situações adversas.

Recente estudo da Organização Não Governamental (ONG) Todos pela Educação, com base no Censo da Educação Superior, revela que cursos ligados à formação docente em Educação a Distância (EAD), como Pedagogia e licenciaturas, apresentaram crescimento de 109,4% de concluintes na rede privada, entre 2010 e 2020, em elevação que se acentuou nos últimos dois anos da análise. No mesmo período, diminuíram os concluintes na modalidade presencial (públicas e particulares), com maior queda na rede privada presencial. Conforme os dados, de cada dez estudantes que se formaram nos cursos de Pedagogia e licenciatura em 2020, foram 61,1%, em EAD e 24,6%, nos demais cursos de Ensino Superior.

“A formação inicial de professores na modalidade EAD, que deveria ser uma exceção, se tornou a principal estratégia de formação docente no país, o que é extremamente grave. Formar professor é coisa séria. Precisa de tempo, de discussões aprofundadas sobre a docência, de vivência nas escolas, de simulações de situações reais de sala de aula. O Ministério da Educação precisa melhorar os processos regulatórios e a avaliação que faz dos cursos. Não podemos ter essa proliferação de cursos, sem clareza sobre a qualidade da formação inicial que vem sendo ofertada para nossos futuros professores”, considera Gabriel Corrêa, líder de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação. “A EAD vai na contramão do que as pesquisas e boas experiências educacionais, mundo afora, indicam ser o mais adequado.”

O educador da ONG aponta que os concluintes em formação de professores via EAD nunca cresceram tanto, como entre 2019 e 2020. Foi um acréscimo de 9,1% (passando, de 52%, em 2019, para 61,1%, em 2020). Mas ele lembra que a tendência já vinha avançando, mesmo antes da pandemia da Covid-19 e da suspensão das aulas presenciais por um longo período nas instituições de Ensino Superior no Brasil.

Indicador Preocupante

Com quase 60% das licenciaturas em EAD (a distância, 59,3%; e presenciais, 40,7%), Gabriel Grabowski, professor e pesquisador da Feevale e da Diretoria da Associação de Escolas Superiores de Formação de Profissionais do Ensino do RS (Aesufope/RS), considera que o indicador do Censo é preocupante e precisa ser considerado. Ele cita que das matrículas nos cursos de licenciatura registradas em 2020, 33,6% estão em instituições públicas de Ensino Superior; e 66,4%, em privadas. Assim, assinala que “para ser professor, a maioria precisa pagar”. Ele explica que o problema não é o simples fato de serem estudos a distância, mas a falta de formação prática, a ausência de práticas de estágio em escolas públicas, oferta de cursos padronizados e sem qualidade, que, muitas vezes, se percebe. “Temos universidades que desenvolvem ótimo trabalho em EAD no RS e outras nem tanto. As universidades e faculdades são diferentes. Temos muitas bem estruturadas em EAD, que fazem pesquisa, cuidam da formação teórico-prática, como a Universidade Aberta do Brasil (UAB), por exemplo. Porém, existem instituições com cursos em alta escala, que resumem o conteúdo a provas e a textos padronizados e sem propiciar a vivência prática.

Gabriel cita que, na Finlândia, cada universidade que forma professor precisa ter uma escola de aplicação. Na União Europeia, são cursos de cinco anos de formação teórico-prática. E, aqui, é possível acelerar formações superiores em menos de quatro anos e serem apenas teóricas. Em México, Chile e Colômbia, não estão sendo feitas formações de professores em EAD. Segundo Gabriel, historicamente, o Brasil não tem tradição em EAD. Fala-se nessa modalidade de 2020 em diante e se percebem muitas com escala mais econômica do que pedagógica e redes de ensino criticando a chegada de docentes ao exercício profissional com falta de prática, de vivência e com necessidade de maior formação.

O especialista destaca ainda questões como ofertas de menor custo em EAD, desprestigio e desvalorização social da carreira do professor e do profissional, além de vencimentos mais baixos em relação a demais cursos superiores no país. Por isso, defende que algumas medidas estruturais precisam ser implementadas imediatamente, como políticas públicas de financiamento da formação inicial de professores, investimento na atratividade e permanência na profissão, valorização social e estatal da profissão docente, reconhecimento profissional, estruturação e planejamento em redes de Instituições de Ensino Superior (IES) para formação em disciplinas e áreas com falta ou potencial carência de professores, formação acadêmica teórico-prática mais densa e instituir residência pedagógica remunerada.

Perfil Docente

O Censo do Ensino Superior 2020 confirma a tendência de redução de matrículas nos cursos de licenciatura nos últimos anos. Licenciaturas tiveram menor ingresso (18%), seguidos de Tecnologia (26%) e de bacharelados (55%).

Em 2020, houve redução de 24 mil matrículas, em relação a 2019: 48,3% em Pedagogia; 9,1%, Educação Física/Formação Professores; 5,7%, Matemática; 5,3%, História; e 4,7%, Biologia, totalizando 73,1% matrículas em cinco licenciaturas. Física, com 1,8%, e Química, 2,3%, agravam a falta de docentes. A maioria dos professores em exercício tem 50 anos ou mais e menos de um quinto até 24 anos.