O réu Mauro Hoffmann disse durante o nono dia de julgamento do Caso Kiss, nesta quinta-feira, que não foi informado da colocação de espumas para tentar solucionar o problema de acústica da boate. De acordo com o réu, o seu papel como sócio na Kiss era mais de investidor, não participando diretamente nas questões administrativas da casa. Em conversa com o parceiro de negócios, ele teria deixado claro o combinado. “Kiko (Elissandro), tu vai administrar e tu vai receber por administrar. Eu não vou me envolver, eu não posso me envolver”, afirmou na sessão no Foro Central de Porto Alegre.
Segundo o acusado, depois da sociedade ter sido feita com Elissandro, ele ficou sabendo do problema de acústica da casa. O impasse teria feito com que ele pensasse em desistir de trabalhar com a Boate Kiss. “Bah, meu galo, mas como que é tu não me avisou isso antes da gente acertar? Tô fora, me devolve meu dinheiro, vou focar numa outra coisa. Não foi isso que nós combinamos. Eu quero saltar fora”, refere-se ele sobre diálogo que teria tido com o sócio.
Após saber do problema, ele afirma ter acompanhado de longe reformas que estavam sendo feitas na boate, indo duas ou três vezes na casa depois de colocadas as espumas, sem ter sido previamente notificado que esta era a “solução” apontada para o problema. De acordo com o réu, era sabido por parte de quem lidava com a casa, que por questões de segurança, não era recomendado o uso de artefatos pirotécnicos em apresentações musicais “Nunca constou em contrato nenhum que a banda Gurizada Fandangueira utilizasse fogos de artifício”, pontuou.
No dia em que ocorreu a tragédia, deixando 242 pessoas mortas, ele relatou que estava em casa e após ter dormido um pouco, recebeu a ligação de Elissandro avisando do incêndio. Segundo o acusado, ele foi o único sócio a ter permanecido no local da tragédia para dar esclarecimentos às autoridades de Santa Maria. Elissandro, de acordo com o réu, teria fugido por ser um “ponto de referência”, já que atuava como proprietário da casa. “Fiquei lá até umas 5h30min. Apresentei-me aos bombeiros como sócio da Kiss. E o Elissandro saiu de lá por medo”, contou.
A decisão dele de permanecer na cena do incêndio teria causado estranheza. “A minha mãe não sabia que eu era sócio, o delegado não sabia que eu era sócio. Eu nunca me coloquei como dono da Kiss”, afirmou. “Eu não tinha a chave da Boate Kiss. Nunca tive a chave”, acrescentou.
Segurança
Após a tragédia, o réu diz ter ficado com bastante receio de estar em Santa Maria, em razão de ameaças da comunidade. “Cheguei a morar em quatro lugares diferentes. Só ia em Santa Maria de madrugada para ninguém me ver”, disse o depoente. Por um lado, conforme ele, foi bom ter sido preso para sua segurança e de sua família. Para ele, conforme conta, é difícil viver com o estigma pós-tragédia. “Ninguém é indiferente a essa tragédia. Não existe isso. É difícil ver as pessoas jogarem este estigma na gente. Querem que a gente arda no inferno e que nós quatro sejamos condenados”, destacou.
Hoffmann foi o terceiro acusado a prestar depoimento no plenário. O ex-produtor da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Bonilha, foi o primeiro a ser ouvido hoje. Ele disse que os clientes da boate nos momentos iniciais do incêndio correram até a porta do estabelecimento e pediram para que a passagem da casa fosse aberta, mas não tiveram resposta. “Eu passei na frente do espelho d´água. Eu vi que as pessoas diziam: ‘tá pegando fogo, abre a porta, abre a porta’. E não abriu a porta”
Já Elissandro Spohr, o outro sócio da boate Kiss, foi escutado nessa quarta-feira. Em sua manifestação, ele relatou que a banda Gurizada Fandangueira fez o uso de artefatos pirotécnicos sem sua autorização na noite da tragédia.
*Com informações do repórter André Malinoski