Um estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mapeou os locais onde há maior risco de contaminação pelo coronavírus (SARS-CoV-2). O levantamento, aplicado na capital pernambucana, Recife, se deu por meio do recolhimento de amostras de superfícies. O resultado final da coleta de 400 amostras apontou três locais onde o risco de contaminação é maior. Em primeiro lugar aparecem os terminais de ônibus e transportes públicos, com 48,7% das amostras positivas para a presença do vírus. Em segundo, os arredores de hospitais, com 26,8%, e, em terceiro, os parques públicos, com 14,4%.
O coordenador do estudo, Lindomar Pena, explicou que os exames não detectaram vírus ativo nas superfícies. “Porém, em algum momento ele esteve ativo naquele local, o que demonstra serem ambientes onde há mais gente infectada circulando”, disse.
Segundo os dados, a coleta das 400 amostras investigou diferentes superfícies em pontos de Recife passíveis de toque frequente: maçanetas, torneiras, vasos sanitários, interruptores de luz, leitores de biometria, catracas e corrimãos de escada, por exemplo. Os lugares selecionados para a pesquisa atendiam a duas condições básicas: grande fluxo e alta concentração de pessoas. Foi feita, a partir daí, uma separação de seis grupos: terminais de passageiros, unidades de saúde, parques públicos, mercados públicos, centros de distribuição de alimentos e áreas de praia.
As amostras foram submetidas ao exame padrão ouro para detecção do coronavírus, o RT-PCR. A presença do SARS-CoV-2 se confirmou em 97 superfícies, o que corresponde a 24% do total das 400 amostras. Para obter maior exatidão, as coletas utilizaram ferramentas de georreferenciamento.
Das 97 amostras positivas, quase metade delas, ou seja 47, foram recolhidas em terminais de ônibus (correspondendo, portanto, a 48,7% do total). As superfícies com maior índice de contaminação foram os terminais de autoatendimento e os corrimãos. As áreas próximas das unidades de saúde ficaram em segundo lugar, com 26,8%, e os parques públicos com 14,4%. Em seguida, aparecem os mercados públicos e as praias, ambos com 4,1%, com os outros lugares analisados somando 2,2%. Nesses lugares, o vírus apareceu mais em banheiros, terminais de autoatendimento, corrimãos, playgrounds e equipamentos de ginástica ao ar livre.
Outro detalhe importante é o tipo de material de cada superfície. Sinais do coronavírus foram detectados especialmente em superfícies metálicas (46,3%) e plásticas (18,5%). Lindomar Pena complementa que os resultados da pesquisa podem ajudar as autoridades de saúde pública a implementar políticas mais eficazes para conter a transmissão comunitária do vírus.
Análise
A divulgação da pesquisa, entretanto, é vista com reservas pelo chefe do Serviço de Infectologia da Santa Casa e professor de Infectologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Alessandro Pasqualotto.“Encontrar o coronavírus em uma superfície não significa que ele seja potencialmente transmitido a partir dali”, observa.
“A crença atual é de que a transmissão é principalmente respiratória. É por gotículas respiratórias de uma pessoa até outra. Então, sim, o transporte público é um local de risco para transmissão, mas porque uma pessoa se coloca muito próxima de outra, então, nesse sentido ela deve estar usando máscara, preferencialmente distanciada e idealmente num ambiente ventilado”, pondera. “Eu sou um descrente da teoria de que as superfícies tenham qualquer papel de relevância na Covid. O coronavírus é uma doença respiratória, primariamente”, salienta.
Quanto a áreas abertas, Pasqualotto considera que a transmissão seja muito rara, se for mantido o distanciamento, e defende que o uso de máscara seja mantido para locais fechados, preferencialmente. “Essa pesquisa presta um desserviço à comunidade, que vai começar a acreditar cada vez mais de que existe o risco associado ao ambiente”, critica, salientando que essa é uma opinião pessoal.
Alerta
Por outro lado, a médica infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) Carolina Deutschendorf considera que o levantamento levanta um dado preocupante, mesmo que o vírus não esteja mais ativo. “O que me preocupa neste tipo de pesquisa é mostrar que realmente há muita gente doente circulando naquele lugar”, destaca.
“Aquele vírus que está na superfície provavelmente não representa maior risco, mas existiu uma pessoa que estava doente e que depositou aquele vírus ali. E pensar que há mais gente infectada num terminal de ônibus do que em volta de um hospital é bem assustador”, pontua.
Quanto às medidas, a médica, assim como Pasqualotto, enfatiza a necessidade do uso da máscara para evitar o risco de ser contaminado ou de contaminar outra pessoa. Além de evitar, sempre que possível, aglomerações. “Se tiver qualquer sintoma gripal, evitar sair de casa”, exemplificou.