FHC vê escalada de autoritarismo: “se ficarmos calados, barco vai encalhar”

Ex-presidente defendeu STF e cogitou apoiar impeachment de Bolsonaro caso presidente não entenda o papel do cargo

Foto: Fabiano do Amaral / CP Memória

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou, nesta segunda-feira, que os signatários de um manifesto suprapartidário, lançado nesse fim de semana, aderiram à iniciativa conscientes da necessidade de defesa do sistema democrático do país. A carta, assinada por representantes de segmentos e correntes políticas diferentes, uniu desde o PT ao PSDB, passando pelo apresentador Luciano Huck e pelo governador do Maranhão Flávio Dino, do PCdoB.

“Nas Diretas, já nos unimos todos. Não podemos ficar calados porque, senão, vamos escorregar. O barco vai encalhar. Eu sou um democrata e temos que combater com força esse autoritarismo, que já recorre até a símbolos nazistas. Estamos nos afastando da democracia e caminhando para o autoritarismo”, alertou. Em entrevista para o Esfera Pública, da Rádio Guaíba, FHC analisou hoje o atual cenário político, econômico e pandêmico que vive o país.

Com relação aos sucessivos ataques promovidos por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF), FHC saiu em defesa da Corte como pilar fundamental de equilíbrio democrático. “Eu sou favorável a que haja uma mediação do STF porque, senão, vamos caminhar para o autoritarismo. Aquele protesto foi abjeto, as pessoas com tochas na mão. Deve haver uma reação forte. Usar símbolos nazistas é um anacronismo. Estes manifestantes estão querendo o que? Uma família real outra vez?”, destacou, em referência ao ato, no último sábado, em frente à sede do STF.

Exilado durante o regime militar no Brasil, FHC repudiou duramente as teorias conspiratórias endossadas pelos bolsonaristas e as teses do guru do presidente, Olavo de Carvalho. “Não é compatível com o mundo de hoje. Não existe ideologia externa. A imprensa está sendo atacada. Estamos marchando para uma insensatez. Não estamos em 1964, em que tinha a União Soviética ou Cuba. Nos dias de hoje, discutir intervenção é puro atraso. Isso é loucura”, frisou.

Fernando Henrique também criticou o teor da reunião ministerial apontada como prova, pelo ex-ministro Sérgio Moro, de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal. “Eu participei de reuniões ministeriais com Sarney, Itamar e quando fui presidente, mas nunca vi uma reunião com tamanha falta de comando, agressões e palavrões. O Brasil deve ter um rumo e o que precisava ser tratado não foi, como o enfrentamento à Covid”, advertiu.

Constituinte, o ex-presidente também explicou que o artigo 142 da Constituição não se refere à possibilidade de golpe de Estado por parte das Forças Armadas, como sugerem manifestantes pró-governo e o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, no fim de semana. “As Forças Armadas são um órgão de Estado, que respeita a Constituição”, resumiu.

Mais uma vez, FHC voltou a aconselhar Bolsonaro a ter uma postura mais plural para atender a sociedade como um todo em meio a dezenas de pedidos de impeachment esperando análise na Câmara Federal. “Acho que um novo impeachment seria ruim para a memória do Brasil. Não torço pelo impeachment dele, mas Bolsonaro precisa entender o seu papel. Por isso, poderei apoiar um processo de afastamento ali adiante”, disse.

Prestes a completar 90 anos, Fernando Henrique Cardoso também lamentou a postura adotada pela atual gestão, que segundo ele repete “muita ‘verdade’, em um mundo cheio de incertezas”.

Ao comentar as eleições de 2022, o líder tucano traçou um perfil de candidato para apaziguar o país. “Precisamos de alguém capaz de unir as forças. O povo não está bem, as pessoas estão morrendo na rua. Temos que ter um governo sensível, que respeite as instituições e seja agregador”, detalhou, ao mencionar que nomes como os dos governadores João Dória (SP) e Eduardo Leite (RS) surgem no cenário, assim como o do empresário Luciano Huck, por exemplo.

Confira a entrevista na íntegra