Em forma de versos…

"Este jornal vai ser feito para toda a massa, não para determinados indivíduos de uma facção". Foto: Arquivo CP

Conforme Dante de Laytano, a  carne continua sendo o alimento indispensável para o gaúcho que, em hipótese alguma, passa sem ela. Não apenas na estância,mas na própria cidade o gaúcho é um carnívoro e não admite sua mesa sem que haja carne para comer. Desde o a formação do Rio Grande e nas estâncias do século passado, até mesmo aos dias de hoje, a fazenda de criação de gado prima e gira completamente em torno da alimentação à base de carne.

Uma receita em forma de versos do Payador Jayme Caetano Braun

ARROZ DE CARRETEIRO 

Nobre cardápio crioulo
das primitivas jornadas,
Nascido nas carreteadas
do Rio Grande abarbarado,
Por certo nisso inspirado,
o xiru velho campeiro
Te batizou de “Carreteiro”,
meu velho arroz com guisado.

Não tem mistério o feitio
dessa iguaria bagual,
É xarque – arroz – graxa – sal
É água pura em quantidade.
Meta fogo de verdade
na panela cascurrenta.
Alho – cebola ou pimenta,
isso conforme a vontade.

Não tem luxo – é tudo simples,
pra fazer um carreteiro.
Se fica algum “marinheiro”
de vereda vem à tona.
Bote – se houver – manjerona,
que dá um gostito melhor
Tapiando o amargo do suor
que às vezes, vem da carona.

Pois em cima desse traste
de uso tão abarbarado,
É onde se corta o guisado
ligeirito – com destreza.
Prato rude – com certeza,
mas quando ferve em voz rouca
Deixa com água na boca
a mais dengosa princesa.

Ah! Que saudades eu tenho
dos tempos em que tropeava
Quando de volta me apeava
num fogão rumbeando o cheiro
E por ali – tarimbeiro
cansado de bater casco,
Me esquecia do churrasco
saboreando um carreteiro.

Em quanto pouso cheguei
de pingo pelo cabresto,
Na falta de outro pretexto
indagando algum atalho,
Mas sempre ao ver o borralho
onde a panela fervia
Eu cá comigo dizia:
chegou de passar trabalho.

Por isso – meu prato xucro,
eu me paro acabrunhado
Ao te ver falsificado
na cozinha do povoeiro
Desvirtuado por dinheiro
à tradição gauchesca,
Guisado de carne fresca,
não é arroz de carreteiro.

Hoje te matam à mingua,
em palácio e restaurante
Mas não há quem te suplante,
nem que o mundo se derreta,
Se és feito em panela preta,
servido em prato de lata
Bombeando a lua de prata
sob a quincha da carreta!

Por isso, quando eu chegar,
nalgum fogão do além-vida,
Se lá não houver comida
já pedi a Deus por consolo,
Que junto ao fogão crioulo,
Quando for escurecendo,
meu mate -amargo sorvendo,
A cavalo nalgum tronco,
escute, ao menos, o ronco
De um “Carreteiro” fervendo.