Não há indicação, na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020, sobre a possibilidade de que os deputados estaduais possam dispor de um montante já estabelecido pelo Executivo (no caso, R$ 55 milhões) no orçamento para emendas parlamentares. A medida foi apresentada como novidade pelo governador em exercício, Ranolfo Vieira Júnior (PTB), a deputados da base durante o café da manhã que antecedeu a entrega da peça orçamentária de 2020 ao Legislativo, na manhã desta quarta-feira. Segundo o anunciado, cada um dos 55 deputados estaduais vai poder indicar até R$ 1 milhão em recursos do orçamento na forma de emendas para obras ou programas, totalizando R$ 55 milhões, e seguindo algumas disposições, como limite de até 10 emendas por parlamentar e valor mínimo de R$ 50 mil. O regramento também não consta no orçamento. Conforme as informações da Secretaria do Planejamento, são sugestões técnicas para facilitar o processo.
A Secretaria informou que, apesar de não existir um detalhamento no projeto da LOA, os R$ 55 milhões virão de parte da chamada reserva de contingenciamento e previdenciária, projetada em R$ 1,9 bilhão para 2020. Do montante, R$ 800 milhões para a parte previdenciária e R$ 1,1 bilhão de contingência propriamente dita. O argumento do governo é de que ampliou a reserva de contingenciamento de 1% para 1,15% da receita corrente líquida (RCL), sendo o 0,15% extra equivalente aos R$ 55 milhões.
A previsão de uma reserva de contingência no orçamento é determinada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) a partir de um percentual da RCL. O artigo 5º da LRF estabelece que o montante deve ser destinado ao “atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos”. Mas, de acordo com a titular do Planejamento, Leany Lemos, a iniciativa do governo estadual segue o modelo federal, que prevê os recursos na reserva de contingenciamento como forma de “esterilizá-los”. Na prática, um modo de impedir que recebam outras destinações.
Além da desconfiança em relação à falta de especificações na LOA, a medida gerou reações imediatas na Assembleia Legislativa. As bancadas do MDB, do PT e do Novo lançaram notas de repúdio ao mecanismo. Os deputados destacaram, entre outros pontos, o fato de que já é atribuição deles apresentar as emendas que considerarem pertinentes, e que o Executivo, ao mesmo tempo em que projeta aumento do déficit, tenta estabelecer no RS, informalmente, a prática de liberar verbas aos parlamentares.
“Não tem essa previsão. É o conto do vigário. A velha política com cara nova, e que vai criar falsas expectativas. Não existe esse dinheiro”, disparou o deputado Sebastião Melo (MDB) na tarde desta quarta. “Não há nenhuma especificação na proposta, ou seja, o governo anunciou informalmente que vai tirar da reserva de contingência. É para inglês ver e os deputados se comportarem. Traduzindo: é uma forma de comprar deputado”, emendou o líder da bancada do PT, deputado Luiz Fernando Mainardi. Em nota, a bancada do Novo anunciou que é contra o instrumento e, por isso, não vai apresentar emendas ao orçamento de 2020.
A secretária Leany Lemos admite que, em função do histórico nacional, a medida pode ser mal interpretada. “Na verdade, é uma possibilidade de os parlamentares levarem a suas bases uma política pública. Nós nos acostumamos a ver emendas parlamentares como uma fonte de fisiologismo ou corrupção. Isso pode acontecer? Pode. Mas aí é caso de polícia, não de planejamento. As emendas podem ser executadas de maneira muito republicana. O valor é pouco perto do montante do orçamento, mas vai se refletir nas demandas das comunidades. A ideia do governador é fazer uma experiência nova e esperamos ter bons resultados”, rebate.