Gigantinho acolhe diferentes pessoas, famílias e histórias contra o frio

Dezenas começaram a se abrigar no início da noite dessa sexta, com termômetros já abaixo dos 10°C

Além de abrigo, pessoas recebem alimentação e imunização contra a gripe | Foto: Guilherme Almeida/CP

A fila que se formou no Gigantinho começou a se dispersar antes das 19h desta sexta-feira, quando os primeiros moradores de rua acessaram o espaço para fugir do frio da madrugada em Porto Alegre. Os termômetros marcavam temperaturas próximas aos 10ºC, mas a sensação térmica às margens do Guaíba era bem menor devido ao vento que soprava nas proximidades do estádio. Mais cedo, colorados e gremistas se uniram num grande gesto de solidariedade, quando doações do Grêmio chegaram à área do Beira-Rio.

Na chegada, as pessoas eram recebidas por uma equipe de saúde que oferecia a possibilidade de serem vacinadas contra a gripe. Quem queria já era imunizado no ato. Ao longo da fila, diferentes rostos e histórias se misturavam: de famílias inteiras querendo passar a noite no Gigantinho, até pessoas sozinhas que procuravam abrigo. Antes das 20h, mais de 100 pessoas já haviam acessado o ginásio, que estava pronto para receber 300 albergados. No espaço onde fica instalada a quadra, os colchonetes já estavam preparados para receber quem iria passar a noite.

Voluntários e funcionários do Inter e da Prefeitura faziam a organização das pessoas que iam chegando. Em outro ponto, a janta era preparada para ser servida a partir das 21h. Diferente de outros abrigos da cidade, no Gigantinho os moradores podiam acessar o local com animais de estimação, que ganharam uma área para pernoitar. Entretanto, assim como outros locais de acolhida da Capital, drogas e álcool tinham a entrada proibidas. Logo após a vacina, as pessoas eram encaminhadas para uma triagem, na qual os pertences eram guardados em sacolas plásticas e identificados para serem entregues no manhã de sábado. Após a entrada dos que aguardavam na fila, o acesso foi sendo mais esporádico, com pessoas chegando aos poucos para entrar no ginásio.

Para Luan Cristiano Pereira, 24 anos, procurar abrigo no Gigantinho tinha um motivo especial. Torcedor apaixonado do Inter, ele é membro da torcida organizada Popular desde 2011. “Meu sentimento é de muita gratidão por estar aqui, pelo que o meu time do coração está fazendo por mim e por tantos outros.” Reconhecido por membros de outras organizadas do clube, ele se mostrava muito à vontade no local, o qual frequenta em dias de jogos mesmo quando não pode assistir à partida. “Muitas vezes eu não tenho dinheiro para entrar, mas sempre venho aqui pelo clima. A coisa que mais gosto é futebol, e o que mais amo é o Inter, o que faço de melhor é torcer.”

Escolher o Gigantinho para se abrigar em uma das noites mais frias do ano é uma consequência de uma decisão fundamental para Pereira, largar as drogas. “Eu estou mais tranquilo, não estou usando muito, e por isso vim pra cá, porque quero ficar tranquilo.” Natural de Sapucaia do Sul, na Grande Porto Alegre, ele conta que foi o vício que o levou a viver nas ruas.

Longe da demanda

Mesmo com o acréscimo de vagas proporcionado pelo Gigantinho, o número de leitos disponíveis é muito inferior a demanda. De acordo com a coordenadora do Plano Municipal de Superação da Situação de Rua, Silvia Mendonça, Porto Alegre tem cerca de 4 mil pessoas morando nas vias da cidade. Somando com as vagas disponibilizadas nos abrigos da cidade, a Capital tem capacidade para receber 715 pessoas, bastante abaixo do total de moradores de rua.

Segundo Silvia, além da escassez de vagas, há também a dificuldade em convencer os moradores de rua a acessarem os abrigos. “Eles não se adaptam às regras, pois é proibido entrar com os animais de estimação, com os carrinhos e também não é permitido o consumo de drogas e álcool, então muitos preferem ficar nas ruas mesmo nas noites mais frias.”

Dentro do Gigantinho, a titular da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e Esporte de Porto Alegre, Nádia Gerhard (MDB), ouviu cobranças de algumas das pessoas que acessavam o local. De acordo com a orientação, apenas quem dormisse ali receberia a doação de roupas e poderia jantar. Porém, alguns dos que estiveram no local queriam apenas comer e conseguir algumas roupas para voltar às ruas. Um dos temores deles era perder o lugar onde dormem sempre.