As 26 pessoas mais ricas do mundo detêm a mesma riqueza dos 3,8 bilhões mais pobres, que correspondem a 50% da humanidade. Os dados, referentes a 2018, fazem parte do relatório global da organização não governamental Oxfam, lançado hoje, às vésperas do Fórum Econômico Mundial, que vai ser aberto amanhã em Davos, na Suíça. Os números sugerem que a riqueza ficou ainda mais concentrada. Em 2017, os mais ricos eram 43.
A fortuna dos bilionários aumentou 12% em 2018, o equivalente a US$ 900 bilhões, ou US$ 2,5 bilhões por dia. A metade mais pobre do planeta, por outro lado, teve o patrimônio diminuído em 11% no mesmo período. Além disso, desde a crise econômica iniciada em 2007, o número de bilionários dobrou no mundo, passando de 1.125 em 2008 para 2.208 no ano passado. O relatório mostra ainda que os homens detêm 50% a mais do total de riqueza do mundo do que as mulheres.
Intitulado Bem Público ou Riqueza Privada?, o documento chama atenção para a necessidade de investimentos em serviços públicos, com destaque para educação e saúde, como forma de diminuir as desigualdades no mundo. “Como metade do planeta vive com menos de US$ 5,50 por dia, qualquer tipo de despesa médica empurra essas pessoas para a pobreza. Garantia de serviço público de saúde é a garantia estável e sustentada para quem está na base da pirâmide”, exemplificou Rafael Georges, coordenador de campanha da Oxfam Brasil.
Taxação
Como forma de redistribuição de riquezas, o relatório propõe uma taxação de 0,5% sobre a renda de bilionários que fazem parte do 1% mais rico do mundo. Segundo a organização, os recursos arrecadados podem ser suficientes para incluir 262 milhões de crianças que estão fora da escola atualmente e também providenciar serviços de saúde capazes de salvar a vida de mais de 3 milhões de pessoas.
“A retomada [do crescimento econômico], ao longo dos últimos dez anos, favoreceu o topo da pirâmide, não foi redistributiva, foi concentradora. O sistema tributário tem um papel central nessa concentração, na medida em que reduz as alíquotas máximas para quem é muito rico. Esse movimento ocorreu em todo o mundo”, avaliou o coordenador.
A Oxfam avalia que os governos contribuem para o aumento das desigualdades ao não taxarem os muito ricos e as grandes corporações e ao não investirem de forma apropriada em saúde e educação. Segundo a organização, no Brasil, os 10% mais pobres da sociedade seguem pagando mais impostos, proporcionalmente, que os 10% mais ricos, e o mesmo ocorre no Reino Unido.
“Diferentemente dos países desenvolvidos, o Brasil é um país que apoia muito a sua carga tributária nos impostos indiretos, e isso acaba pesando mais no bolso da classe média e dos mais pobres. Todo mundo que compra o mesmo produto, paga a mesma carga. O ideal seria equilibrar isso, jogar mais a tributação para renda e patrimônio e diminuir a carga do consumo”, propôs Georges.
A organização destaca que, entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é o que menos tributa renda e patrimônio. Enquanto no Brasil a cada R$ 1 que é arrecadado, R$ 0,22 vêm de impostos sobre a renda e do patrimônio, na média dos países essa parcela equivale a R$ 0,40 para cada R$ 1 pago em tributos. Nos Estados Unidos, por exemplo, 59,4% da arrecadação vêm de impostos sobre a renda e o patrimônio da população.
Aumento da concentração
Georges avalia que dois fatores explicam, em parte, a concentração de riqueza no mundo: a guerra fiscal internacional e a existência de paraísos fiscais. “Existe uma dificuldade dos sistemas políticos, seja nacional ou internacional, de implantar medidas sérias de redistribuição. Em particular na questão tributária existe uma corrida para trás”, apontou. Para o coordenador da Oxfam Brasil, a guerra fiscal internacional – similar ao que ocorre entre os estados brasileiros em relação ao ICMS – “joga contra” a possibilidade de redistribuição de riquezas.
Outra parte, segundo ele, é explicada pela existência de paraísos fiscais. “Enquanto tiver países onde não se cobra nenhum tipo de tributo e se oferecem garantias de sigilo e de ocultamento de propriedade e de patrimônio, vai ter incentivo para que ninguém queira redistribuição de seu patrimônio e sua renda. A economia sempre vai ter uma válvula de escape que vai preservar uma espécie de elite global”, avaliou.