Liberação de bebidas nos estádios não gera benefício público, defende Juizado do Torcedor

Já o Ministério Público entende que há desajuste da lei estadual em relação à federal

A possibilidade de liberação de bebidas alcoólicas nos estádios, através de projeto de lei aprovado nesta terça-feira pela Assembleia Legislativa, é vista de forma negativa pelo Juizado do Torcedor. Segundo o órgão, a medida não gera benefício público capaz de contribuir com o coletivo. Em entrevista à Rádio Guaíba, o titular do Juizado do Torcedor e Grandes Eventos, Marco Aurélio Martins Xavier, as bebidas serão um fator extra para simular ações e reações violentas e voltarão a dificultar o trabalho do poder público nos estádios dos clubes.

“Essa lei vem totalmente na contramão de todos os esforços que a gente vem desenvolvendo ao longo dos últimos dez anos em que o judiciário atua nos estádios, trabalhando a discussão da conscientização coletiva, sobre a prevenção da violência nos estádios. É um retrocesso”, disse Marco Aurélio.

O titular também defendeu que bebida alcoólica “não combina” com o esporte. “O futebol é emocional. Mexe com os sentimentos mais ‘animalescos’ do ser humano. Então não há nenhuma necessidade de colocar nenhum outro ingrediente para intensificar emoções no ambiente”, declarou. Marco Aurélio ainda criticou a Assembleia Legislativa, dizendo que é preciso definir qual a prioridade nos estádios: crianças, idosos, mulheres e pessoas que efetivamente vão aos jogos ou uma minoria que quer beber. “Pelo que se vê, essa liberação está priorizando interesse pontual de meia dúzia de pessoas que vão lá”, finalizou.

Para Ministério Público, há desajuste na lei 

Já o Ministério Público entende que há desajuste da lei estadual em relação à federal – no caso, o Estatuto do Torcedor. “Existe uma impossibilidade de a lei estadual contrapor a legislação federal. Essa lei estadual trata da proibição da bebida nos estádios de futebol. E, para se abrir uma janela para a liberação, foi colocado o inciso terceiro no parágrafo 2º, que tenta desdizer toda a lei numa técnica legislativa que não nos parece minimamente adequada”, defendeu o titular da Promotoria Especializada do Torcedor, Marcio Bressani.

Ainda segundo o promotor, outros estados do Brasil, que já liberaram o consumo de bebida alcoólica nos locais de jogos, viraram alvo de ações de inconstitucionalidade em curso no Supremo Tribunal Federal. “O que o MP defende é que, no pilar legislativo, não se sustenta liberação. Tem também um outro pilar, que é a questão moral e relacional dos estádios, da pacificação dos estádios, que o Ministério Público também vê com bastante atenção e preocupação… As consequências práticas de eventual liberação, considerando tudo o que já se conquistou em termos de pacificação nos estádios”, disse Bressani.

Projeto

Por 25 votos a 13, a Assembleia Legislativa aprovou ontem o projeto de lei que permite a comercialização e o consumo de bebida alcoólica em estádios de futebol e ginásios de esportes do Rio Grande do Sul. De autoria dos deputados Gilmar Sossella e Ciro Simoni (PDT), a proposta tramitou por um mês no Parlamento. Ela restringe a liberação da venda durante o primeiro tempo do jogo e após o término da partida. Quem descumprir a regra (vendendo, por exemplo, durante o intervalo e o segundo tempo do jogo) fica sujeito a punições que vão de advertência escrita a rescisão contratual.

A legislação estadual que proíbe a comercialização e o consumo dentro dos estádios vigora desde abril de 2008, a partir de um projeto protocolado pelo então deputado estadual Miki Breier (PSB), hoje prefeito de Cachoeirinha. Como justificava, os proponentes citaram episódios vividos em Porto Alegre durante a Copa de 2014, quando houve liberação do álcool no Beira-Rio.

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