Futuro ministro do Meio Ambiente responde por ação de improbidade

Ricardo Salles admite que é réu, mas que não há decisão contra ele

Foto: Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo/Divulgação

O ex-secretário do Meio Ambiente do governo paulista de Geraldo Alckmin, Ricardo Salles, que vai comandar o Ministério do Meio Ambiente a partir de janeiro, conforme anunciou ontem o presidente eleito, Jair Bolsonaro, responde a ação civil por improbidade administrativa, acusado de alterar ilegalmente o plano de manejo de uma área de proteção ambiental para supostamente favorecer interesses do empresariado.

No período em que esteve à frente da Secretaria do Estado de São Paulo – de julho de 2016 a agosto de 2017 –, ele foi alvo de ação do Ministério Público (MP-SP), acusado de irregularidades durante a elaboração do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) da Várzea do Rio Tietê, em 2016. O processo foi aceito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e está em fase de sentença. Já o plano de manejo está suspenso por causa da ação, segundo o promotor Silvio Marques.

Os mapas de zoneamento já haviam passado por análise e votação na Comissão Temática de Biodiversidade, Florestas, Parques e Áreas Protegidas (CTBio), órgão auxiliar do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), destinada pela legislação a essa atribuição.

Demandas apresentadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e pela Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), que já tinham sido debatidas pelos membros da CTBio e que foram rechaçadas pela comissão, foram contempladas no plano de manejo por meio das mudanças realizadas por Salles.

O MP sustenta que não havia qualquer justificativa para alteração no plano de manejo e que elas foram feitas por determinação do secretário Estadual do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Defesa
Em entrevista à Rede Globo, Salles apresentou defesa: “Em certos lugares, onde diziam que era área de preservação, já tinha estação de tratamento de esgoto, havia avenidas, conjuntos residenciais da CDHU [Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo]. Quer dizer, se nós deixássemos aquele plano de manejo ser aprovado daquela forma, absolutamente desconectado da realidade, o prejuízo a todos, à sociedade, ao desenvolvimento econômico e ao meio ambiente, seria enorme”.

O indicado comentou ainda, na entrevista, o andamento do processo. “Sou réu, mas não há decisão contra mim. São todas favoráveis a mim. Todas as testemunhas foram ouvidas, todas as provas produzidas e o processo está concluso para sentença, pode ser sentenciado a qualquer momento. Todas as testemunhas ouvidas, de funcionários do governo e fora, corroboraram a minha posição”, afirmou Salles.

Citada pelo MP, a Fiesp foi procurada pela reportagem da Agência Brasil, e não se pronunciou até o momento. A Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo informou, em nota, que não vai se manifestar.

Ambientalistas
As polêmicas que envolvem o Ministério do Meio Ambiente começaram logo após vitória de Bolsonaro nas eleições, quando chegou a ser anunciada a fusão dos ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente. Depois de reações negativas, o presidente eleito recuou da decisão.

No entanto, a escolha de Ricardo Salles para comandar a pasta do Meio Ambiente gerou críticas de várias organizações que defendem direitos ambientais.

A coalização de organizações da sociedade civil Observatório do Clima avaliou assim a indicação: “Se por um lado contorna o desgaste que poderia ter com a extinção formal da pasta, por outro garante que o MMA [Ministério do Meio Ambiente] deixará de ser, pela primeira vez desde sua criação, em 1992, uma estrutura independente na Esplanada. Seu ministro será um ajudante de ordens da ministra da Agricultura”, acusou a entidade em nota.

O Greenpeace considera que a nomeação de Salles ocorre no momento em que a área ambiental recebe más notícias, quando o desmatamento da Amazônia registrou o maior índice dos últimos dez anos e o país acaba de retirar a candidatura para sediar a COP-25. E também julga que vai favorecer os setores ligados à agricultura. “A principal função do novo ministro será a promoção de uma verdadeira agenda antiambiental, colocando em prática medidas que vão resultar na explosão do desmatamento na Amazônia e na diminuição do combate ao crime ambiental. O que já está ruim pode piorar”, afirmou Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.

A WWF, outra organização não governamental internacional, comentou a nomeação, dizendo que esta é uma pasta estratégica para o Brasil. A entidade salienta que a destruição ilegal das florestas na Amazônia e do Cerrado diminuem a competitividade dos produtos brasileiros diante de um mercado global que busca produtos livres de desmatamento, além de prejudicar o cumprimento dos compromissos que o Brasil assumiu no Acordo de Paris, como a diminuição na emissão de gases de efeito estufa.

“Desejamos que o Ministério do Meio Ambiente cumpra a missão de balancear as questões ambientais nas outras pastas do governo, zelando assim para que o Brasil tenha medidas necessárias para proteger de forma estratégica o nosso imenso patrimônio natural. E que tenha capacidade de dialogar com os diversos setores da sociedade, uma vez que o direito à um meio ambiente saudável se aplica a todos, desta e das futuras gerações”, disse Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.