Condenados homens que discriminaram frentista haitiano em Canoas

Caso ocorreu em 2015

Dois homens foram condenados na Comarca de Canoas pelo crime de discriminação de procedência nacional contra dois haitianos, frentistas em um posto de gasolina. Gravado em vídeo, o fato, ocorrido em meados de 2015, teve repercussão depois de publicado no Youtube.

A juíza Patrícia Pereira Krebs Tonet, da 2ª Vara Criminal local, analisou a ação, proposta pelo Ministério Público. Pelos crimes, Daniel Barbosa de Amorim recebeu pena de seis anos de reclusão e Alex de Jesus da Silva, de dois anos e meio. O regime inicial é o semiaberto. Alex teve a pena substituída por prestação de serviços à comunidade.

“Longe de apenas chamar a atenção para problemas sociais como desemprego e imigração, seja ela legal ou ilegal, os réus expuseram as pessoas (antes de imigrantes) à situação altamente vexatória, constrangedora, discriminatória, em razão de sua nacionalidade”, afirmou a juíza, na sentença.

A ação é filmada pelo réu Alex com a câmera de um celular. É Daniel quem interpela o imigrante haitiano (“De onde cê é, irmão?”), cobrando-lhe pelo fato de estar trabalhando enquanto milhares de brasileiros sofrem com o desemprego. Em tom irônico, ele fala que o estrangeiro é pessoa de sorte e competência. O imigrante não parece entender bem e, entre respostas monossilábicas, segue lidando na bomba de gasolina. Outro haitiano, parente do primeiro, também aparece sendo interrogado pelo réu, mas escapa da abordagem.

Daniel aparece vestindo traje camuflado e ostentando um pingente com símbolo do Batalhão de Operações Especiais (Bope) do Rio de Janeiro – em postura que a julgadora qualifica de intimadora. O réu culpa o governo “comunista” da então presidente Dilma Roussef pela chegada de imigrantes do Haiti, Angola e Venezuela.

Em vários momentos, Daniel pergunta para o frentista se ele passou por treinamento militar ou de guerrilha. “Meu irmão, a gente já ‘tá’ em guerra”, fala ele em dado momento, encarando a câmera.

Para a juíza, os haitianos foram alvo de ironias e acusações inconsistentes ‘que sequer compreendiam de forma clara’, em atitude que extrapolou a garantia de liberdade de expressão oferecida pela Constituição Federal. Ela chamou atenção para o fato de as vítimas terem sumido após o episódio, no que suspeita seja consequência do alarde decorrente (pedidos de entrevistas, críticas negativas e favoráveis).

Quanto ao uso do símbolo do Bope, a juíza afastou a alegação de que o material pode ser comprado em lojas especializadas e também penalizou Daniel pelo uso indevido de sinal/selo público.

O que prevê a lei 

A Lei Federal 7.716, de 1989, define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” prevê pena de reclusão de um a três anos e multa. “Se qualquer dos crimes previstos (…) é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza” (no caso, o YouTube), a pena sobe para de dois a cinco anos e multa.

Já quem altera, falsifica ou usa indevidamente “marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública” está sujeito à pena de reclusão, de dois a seis anos, e multa, conforme o Código Penal.